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Litígio entre empresas esquenta demanda por arbitragem

Nunca se brigou tanto no Brasil. E não se trata de mau humor sobre política ou futebol nas redes sociais. As diferenças, muitas vezes de difícil conciliação, estão acertando em cheio o mundo as empresas. Essa tendência pode ser medida pelo uso da arbitragem, um dos principais métodos alternativos de resolução de conflitos empresariais, vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil.

Além da conhecida lentidão do Judiciário, que faz com que as disputas atravessem ou superem uma década em intermináveis instâncias burocráticas, também pesa a favor dessa ferramenta a possibilidade de realizar o julgamento numa esfera 100% privada e com árbitros escolhidos pelas próprias partes e especializados no tema em questão.

A reportagem de Experience Club entrevistou porta-vozes das duas principais câmaras de arbitragem com atuação no país, advogados especializados e árbitros para entender como o método pode ser benéfico ao ambiente de negócios. O volume de negócios para as câmaras esta quente: juntas, as instituições somam 380 casos em andamento no país.

Prevendo litígios no futuro, a inclusão de cláusulas arbitrais em operações de grande porte são comuns. Fusões e aquisições, por exemplo, só são fechadas após os advogados das partes envolvidas acertarem detalhes desse tipo.

“O melhor contrato possível é aquele que possibilita o fechamento do negócio e funciona para aquele momento”. [autor]Luis Fernando Guerrero, do escritório Lobo & De Rizzo.[/autor]

Para discordâncias que poderão surgir no futuro, como questões societárias ou de mudança em relação ao cenário econômico, a arbitragem entrará em ação.

“A grande vantagem é que não caberá recurso à decisão arbitral. O caso será analisado por especialistas na área, de forma definitiva. Se estivesse no Judiciário, demoraria uns três anos só para ser distribuído a um juiz”, compara.

“Mesmo que o Judiciário funcionasse bem, há casos que, por sua complexidade, podem funcionar ainda melhor na arbitragem. É preciso considerar que, na Justiça, o processo é distribuído aleatoriamente, para juízes generalistas”, lembra Daniela Gabbay, professora da FGV Direito de São Paulo.

O cenário favorável à arbitragem no país, cuja constitucionalidade da lei aconteceu em 2001, também traz oportunidades de negócios para as câmaras. Uma clara mostra disso foi a chegada da principal do planeta – A Corte Internacional de Arbitragem, a francesa ICC, ao território nacional, em 2017.

Desde sua abertura, há somente dois anos, a equipe brasileira da câmara ICC já registrou 61 processos de arbitragem. Desses, 20 casos envolveram a administração pública.

“Atualmente, temos em curso na equipe do Brasil 53 casos. Os principais setores econômicos envolvidos são transportes, construção, energia e serviços. O volume financeiro em disputa nas arbitragens em curso na equipe do Brasil ultrapassa R$ 27 bilhões”, detalha Patrícia de Figueiredo Ferraz, Conselheira do escritório do Brasil da Secretaria da Corte de arbitragem da CCI.

Num processo desse tipo, cada uma das partes escolhe um árbitro. Um terceiro, em geral escolhido pela câmara, é nomeado para presidir o painel.

Com cerca de metade do mercado de arbitragem do Brasil, o núcleo da Câmara de Comércio Brasil Canadá (CCBC) conta com cerca de 120 nomes cadastrados.

Até o último dia 26, a CCBC contava com 327 casos em andamento. Considerado o ano passado fechado, as arbitragens administradas pela câmara somaram R$11,3 bilhões em disputa.

Patrícia Kobayashi, Secretária Geral do CAM-CCBC, destaca que, como ambiente de realização das arbitragens, a câmara proporciona toda a infraestrutura necessária à resolução de conflitos.

“As partes produzem perícias e provas de forma livre e recebem assistência técnica para isso. O volume de documentação envolvido é verdadeiramente inacreditável. A diferença é que, hoje, não envolve mais papel”.

Mesmo que um bom número de arbitragens seja resolvido em menos de dois anos, essa não é uma regra. Há disputas, sobretudo aquelas de áreas ligadas à infraestrutura, que demandam mais prazo.

“Imagine o número de perícias e o grau de complexidade existente num processo que analisa uma obra com 15 mil funcionários. São necessárias perícias de engenharia e contabilidade para obter conclusões”, exemplifica Adriana Braghetta, sócia da área de arbitragem do L.O. Baptista Advogados.

Segundo ela, do total das arbitragens em que está envolvida – como advogada ou árbitra , 40% envolve obras.  

Outras questões podem fazer com que processos arbitrais demorem mais do que as partes desejam.

“A arbitragem cresceu muito e num determinado momento começou a faltar árbitro. Agora, há escassez de peritos especializados.”

“Às vezes o processo pode demorar um pouco para começar, pois nem sempre os árbitros mais requisitados têm agenda e disponibilidade imediata”, comenta José Nantala Bádue Freire, especialista em Arbitragem do Peixoto & Cury Advogados.

A resolução do conflito também pode ter ritmo mais lento quando um dos envolvidos usa o conflito como estratégia.

“Há casos em que uma das partes adota litigiosidade excessiva, questiona a imparcialidade do árbitro escolhido pela outra parte. Se ele renunciar, outro terá de ser escolhido, o que toma tempo”, lamenta Antonio Marzagão Barbuto Neto, sócio na área de Arbitragem de TozziniFreire.

Outro impulso à arbitragem deve vir de um decreto. Publicado no final de setembro pelo governo federal, ele acaba de vez com qualquer dúvida sobre a possibilidade de entes e empresas estatais poderem participar de processos arbitrais.

“Esse documento é importante num momento em que o país se prepara para uma grande rodada de desinvestimentos públicos e abre espaço, com segurança jurídica, para investimentos privados”, projeta Neto. 

Texto: Luciano Feltrin

Imagens: Unsplash e divulgação

 

 

 

 

  

    

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