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Lifelong learners

O aprendizado autônomo e contínuo como ferramenta para quem quer se manter relevante em um mundo em rápidas e intensas transformações

Ideias centrais: 

1 – Na visão da Unesco, “a aprendizagem ao longo da vida desempenha um papel vital na garantia de uma paz duradoura e uma coesão social mais forte, apoiando a aquisição e a prática contínua de uma cidadania ativa, democrática e responsável”. 

2 – Psicologicamente somos adultos quando nos reconhecemos como autossuficientes, capazes de dirigir a própria vida. Para a aprendizagem, essa definição é importante. Por isso, o ponto central da andragogia é a autonomia do aprendiz. 

3 – Aprendizagem autodirigida é um processo pelo qual indivíduos têm a iniciativa, com ou sem a ajuda de outros, de diagnosticar as suas necessidades de aprendizado, estabelecer metas e identificar os recursos humanos e materiais para o aprendizado. 

4 – Projetos de aprendizagem demandam um compromisso semanal de algumas horas, pelo menos, e devem fazer parte de sua rotina.  A etapa de planejamento deve contemplar as quatro fontes de aprendizagem: conteúdo, experiência, pessoas e redes (CEP+R), evitando concentrar-se somente no conteúdo. 

5 – Para organizar o conhecimento de seu projeto de aprendizagem, é útil criar um commonplace book, que é um local, físico ou digital, para consolidar suas ideias, histórias, informações e observações que encontrar. Isso é uma réplica moderna dos cadernos de anotações de Leonardo da Vinci. 

Sobre o autor: 

Conrado Schlochauer é mestre em criatividade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e doutor em Aprendizagem de Adultos pelo Instituto de Psicologia da USP. Realiza palestras sobre aprendizagem ao longo da vida nas principais organizações do Brasil. 

Introdução 

Em 2012, concluí o doutorado em Psicologia da Aprendizagem na Universidade de São Paulo (USP), apresentando uma tese sobre autodireção do aprendizado em ambientes informais. Só depois me dei conta de que o tema de minha pesquisa era exatamente o contrário de tudo o que eu havia feito na vida até então: aprender sem professores ou facilitadores e sem sala de aula. 

Por sorte ou sincronicidade, terminei a pesquisa no momento de mundo em que, finalmente, o aprendizado ao longo da vida – um desenho idealizado em 1970 – começou a ter condições para se tornar realidade com mudanças aceleradas e a existência de uma rede de pessoas e conhecimentos cada vez maior e mais conectada. 

As pesquisas acadêmicas se misturaram com as décadas de experiência. Como resultado, passei a ser ativista de um modelo que reconhece a importância da autonomia como base para o desenvolvimento de aprendizes ao longo da vida, ou lifelong learners.  O caminho, na minha visão, é criar condições para que adultos se percebam capazes de aprender de maneira autodirigida. 

PARTE 1 Porquê 

Capítulo 1 – A aprendizagem ao longo da vida 

Bill Gates teve sorte de ter tantos elementos combinados ao mesmo tempo: capacidade intelectual, uma escola estimulante, apoio da família e amigos, além de sucesso financeiro incomparável. Claro que isso ajudou e ajuda muito. Contudo, o que mais me chama a atenção é sua curiosidade infinita pelos grandes problemas do mundo somada à crença que tem na própria capacidade de contribuir com eles. 

Este livro não é para poucos escolhidos pela genética ou pelo sucesso empresarial. Ao contrário. Minha experiência com centenas de milhares de alunos não deixa qualquer dúvida de que o aprendizado ao longo da vida pode ser uma realidade para cada pessoa deste planeta. Mais do que isso, acredito intensamente que quanto mais aprendizes autônomos confiantes e apaixonados conseguirmos formar, menores serão os problemas do mundo. 

O conceito de aprendizagem ao longo da vida propriamente dito desenvolveu-se um pouco mais à frente, incubado nos ideais democráticos e libertários das revoluções estudantis de 1968. Ao redor dessa época, três organismos internacionais – Conselho da Europa, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – lançaram as bases para a construção de uma visão que se transformaria em novo paradigma na educação mundial. 

A Comunidade Europeia também entendia que o conceito de aprendizagem ao longo da vida proposto ainda não tinha se concretizado. O Parlamento Europeu estabeleceu que 1996 seria o Ano Europeu da Educação ao Longo da Vida. Alguns anos depois, a Comissão das Comunidades Europeias elaborou o memorando sobre aprendizagem ao longo da vida com a intenção de alinhar os conceitos discutidos até aquele momento. Ao mesmo tempo, conclamou seus Estados-membros a liderarem o debate e a implementação da visão proposta.  Na introdução, o documento reconhece, de maneira “indiscutível”, a entrada na “Era do Conhecimento”, e revela que, portanto, a aprendizagem ao longo da vida deveria deixar de ser um componente da educação e da formação para tornar-se um princípio orientador de deveria ter sua execução prática implementada ao longo da década. 

Capítulo 2 – As duas revoluções 

Estamos vivendo, ao mesmo tempo, duas revoluções que se interligam e pedem mudanças no processo de desenvolvimento de toda a sociedade. 

No mundo do trabalho, vivemos mais uma revolução industrial, a quarta. Foi ela que colocou a transformação digital na agenda de todas as empresas nos últimos anos. No mudo educacional, vivemos uma revolução do conhecimento. Se, antes, o papel principal da escola era transmitir conteúdos, agora ela tem a função de nos ajudar a conviver com o excesso de informação. Essas duas revoluções criaram o cenário perfeito para o aprendizado ao longo da vida sair do papel e se tornar uma demanda fundamental para todos. 

Mas a Quarta Revolução Industrial não é a digital, então, o que a caracteriza? De maneira geral, significa a integração das tecnologias. O sequenciamento genético rápido só foi possível graças ao avanço do processamento de dados. A internet das coisas só acontece com uma sinergia entre os mundos virtual e concreto. O que Schwab batizou de Quarta Revolução Industrial foi, enfim, a fusão das tecnologias, eliminando fronteiras entre o mundo físico, digital e biológico. Seu impacto em empresas e pessoas é muito maior do que nas revoluções anteriores, que não tinham a escala, a complexidade ou o potencial de transformação que a atual trouxe. Por isso, estamos experimentando uma mudança tão radical na maneira como trabalhamos e vivemos. 

Todas as discussões teóricas dos anos 1970 que apresentamos no capítulo anterior finalmente se materializaram de maneira clara e atemorizante. Profissões consolidadas são substituídas por outras recém-inventadas em uma velocidade impensável. Há também o crescimento de desafios sociais. A aprendizagem ao longo da vida, desde sua criação, não tem só o objetivo de garantir trabalho. Manter uma vida profissional ativa é parte integrante da vida, fundamental para a nossa subsistência. Mas apenas uma parte. Para sermos cidadãos plenos, integrados ao mundo em que vivemos, precisamos de mais do que garantir nossa subsistência. 

Na visão da Unesco, “a aprendizagem ao longo da vida desempenha um papel vital na garantia de uma paz duradoura e uma coesão social mais forte, apoiando a aquisição e a prática contínua de uma cidadania ativa, democrática e responsável”. 

O SkillsFuture, um programa de lifelong learning de Cingapura, é um movimento nacional que fornece oportunidades para todos os cidadãos desenvolverem seu potencial ao longo da vida. O programa tem quatro direcionadores-chaves: 

  • Ajudar as pessoas a fazerem escolhas bem-informadas em educação, treinamento e carreiras; 
  • Desenvolver um sistema integrado de educação e treinamento de alta qualidade; 
  • Promover o reconhecimento do empregador e o desenvolvimento de carreira com base em habilidade e; 
  • Promover uma cultura que apoie e celebre a aprendizagem ao longo da vida. 

Capítulo 3 – Aprender sempre é possível 

Uma questão a se considerar é que o cálculo da longevidade de toda a população é impactado pela mortalidade infantil, que ainda é alta. Uma forma de isolar esse fator é a expectativa de  vida aos 50 anos. Em 1940, uma pessoa nessa faixa etária vivia até os 69 anos, em média. Atualmente, a expectativa para quem chegou aos 50 anos é de 80,7 anos. 

Ter mais longevidade não quer dizer apenas que ganhamos mais cinco, dez ou vinte anos de vida. Com uma vida mais longa, mudamos o conceito de meia idade ou velhice.  Lynda Gratton é uma psicóloga britânica focada no estudo do aumento da longevidade e como ela impacta as pessoas e a sociedade. Ela propõe um conceito muito interessante para entender o fenômeno: a inflação etária. O que era considerado velho no meio do século passado é completamente diferente do que é agora. É a comprovação de que a frase “cinquenta são os novos trinta” tem uma base mais racional do que imaginávamos. 

Psicólogos destacam que um dos aspectos mais relevantes da Psicologia do Desenvolvimento para a Aprendizagem de Adulto é a constatação de que, ao longo da vida, a inteligência fluida (relacionada ao processamento de informações) pode apresentar declínio. Em contrapartida, a inteligência cristalizada (relacionada a aspectos mais pragmáticos e ao conhecimento adquirido) mantém-se estável ou apresenta declínio apenas em adultos muito idosos. Os pesquisadores destacam ainda que a capacidade cognitiva de um adulto é contextual. Ela depende do domínio e atuação. Um adulto demonstra habilidade adaptativa utilizando sua experiência anterior como uma alavanca para a solução de problemas complexos. Um nome bom para isso é sabedoria. Como desenvolvê-la? 

O primeiro caminho é um bom condicionamento físico. O segundo e mais relevante é a busca consciente pelo aprendizado ao longo de toda a vida. Nossas funções cognitivas estarão mais ou menos ativas de acordo com o uso que fizermos delas e com nossa exposição a ambientes interessantes e diversos. O século XXI é o momento perfeito para isso. 

Capítulo 4 – Invertendo os sinais 

A questão é que o sistema de ensino tradicional baseia-se em motivação extrínseca: controle de presença, de comportamento e de desempenho quase sempre repletos de culpa e punição. Avaliações frequentes e o estigma social de não passar de ano geram um ambiente em que o medo muitas vezes prevalece. 

Douglas Thomas e John Seely Brown são dois pesquisadores norte-americanos e provocadores do modelo tradicional de educação. Eles escreveram o livro A New Learning Culture [Uma nova cultura de aprendizagem] em que destacam a importância da imaginação para um mundo em mudança constante. Para eles, precisamos sair de uma abordagem baseada no ensinar para uma outra cultura baseada no aprender. Nesse olhar, o papel principal passa a ser criar as condições para que o aprendizado ocorra. 

Para que essa nova cultura surja, temos de fazer algumas mudanças importantes. Em primeiro lugar, o modelo de sala de aula muda de um espaço para transmitir conhecimento e passa a ser um ambiente de aprendizagem em que o meio digital dá acesso à informação e diversão. Além disso, em vez de aprender sobre o mundo, passamos a aprender com o mundo. Finalmente, deixamos de esperar que o aprendiz apenas conheça a informação transmitida. 

Capítulo 5 – Afinal, o que é aprendizagem? 

Juan Ignacio Pozo é uma grande referência por conseguir misturar conhecimento teórico profundo com um olhar provocativo e propositivo de maneira brilhante. Em seu livro Aprendizes e mestres, ele diz que aprendizagem “é uma categoria natural, cujas fronteiras com outros conceitos afins (por exemplo desenvolvimento, ensino, memória etc.) estão um tanto esfumaçadas […]”. Em resumo, existem diversas definições possíveis e boa parte das diversas definições possuem dois aspectos em comum: aprendizado ocorre quando vivemos experiências que nos causam mudanças. 

Dentre as inúmeras definições possíveis, fiz minha escolha com uma vulnerabilidade consciente. Optei pela simplicidade. Aprendizado é a explicitação do conhecimento por meio de uma performance melhorada. Essa é a minha definição. Aprendemos quando passamos por um processo que nos permite realizar algo de maneira melhor ou diferente do que fazíamos antes, seja por aquisição de uma habilidade ou pela mudança da nossa visão de mundo. Aprender é colocar conhecimento para fora, não para dentro. 

Fomos para a escola, faculdade ou curso técnico porque esse é o caminho natural da vida de qualquer criança, adolescente e jovem adulto. O objetivo é estarmos formados. 

No século XXI, essa forma deixou de funcionar, e uma mudança grande se faz necessária a partir daí: temos que escolher, intencionalmente, aprender. Estabelecer tempo na agenda semanal, definir quais habilidades são relevantes, buscar fontes adequadas e interessantes, lidar com ansiedade e frustração tão naturais ao processo. O desafio parece grande, mas é possível. 

O início do processo é reconstruir sua autoimagem como aprendiz. 

Capítulo 6 – Um novo caminho 

Para saber o que devemos aprender, precisamos dar alguns passos para trás. Em primeiro lugar, entender onde estamos e onde queremos estar. A partir daí, podemos ponderar e entender o que precisamos mudar ou fazer melhor para atingir o que queremos. Há ainda, um terceiro aspecto: temos motivação e paixão para investir energia num processo de aprendizagem na área escolhida? 

Esse é um processo de reflexão tão profundo quanto agradável. E ele é o ponto de partida fundamental para a formação de um lifelong learner. O problema é que o caminho natural, para a maioria, é procurar um curso, um livro ou um vídeo. Aquisição de conteúdo como sinônimo de aprendizagem é um traço muito forte da nossa vivência educacional. 

Eu e Alex Bretas – grande parceiro e ativista do aprendizado autodirigido como eu – estruturamos as fontes de aprendizagem em quatro categorias diferentes: conteúdo, experiências, pessoas e redes (CEP+R). Nosso uso delas foi empírico, quase como um lembrete de que aprender tem vários caminhos. Neste livro eu me aprofundei em cada uma delas e acrescentei aspectos práticos que facilitam o aproveitamento de cada fonte. 

  • Conteúdos continuam a ser relevantes. Eles são meios importantes para ajudar a criar alicerces que são a base para a construção de um conhecimento mais sólido. É a partir daí que construímos conceitos. Saber fazer curadoria, escolher as mídias e fazer uma leitura ativa são habilidades muito importantes para um aprendiz ao longo da vida. 
  • Experiências são a base do aprendizado adulto. Podemos e devemos fazer uma busca ativa de quais atividades e vivências nos apoiarão na trilha do desenvolvimento que escolhemos. Durante o projeto, ter espaço de experimentação e prática é imprescindível. 
  • Pessoas são uma fonte de aprendizagem muito subaproveitadas. É comum nos conectarmos com alguém quando temos uma dúvida. Entretanto, podemos aproveitar muito mais as trocas se estruturarmos um encontro com alguém que tem algo a nos ensinar. 
  • Redes ou comunidades são grandes impulsionadores para o aprendizado individual. Os motivos são muitos: trocas, engajamento, relacionamento e até pequena pressão social positiva. Autodireção não é estar sozinho no processo. Grupos podem ter um papel fundamental na continuidade e no prazer de se conduzir projetos pessoais de aprendizagem. 

PARTE 2 – Como 

Capítulo 7 – O aprendiz adulto 

Em 1926, aos 41 anos, Eduard Lindeman publicou o livro The Meaning of Adult Education. O texto já apontava os problemas e as mudanças necessárias no modelo – boa parte ainda é discutida hoje, quase cem anos depois. Sua experiência como adulto aprendiz gerou provocações e ideias valiosas até hoje. Ele utilizou o termo “educação de adultos”, mas, no meu ponto de vista, referia-se à oportunidade de repensar a maneira como seria definido o aprendizado ao longo da vida. Tinha a crença cristalizada de que educação é vida – não uma mera reparação para um futuro desconhecido. 

No mesmo ano da publicação do livro, foi fundada a Associação Americana de Educação de Adultos. Iniciou-se um período de maior interesse em se estabelecer uma teoria voltada para adultos. As pesquisas se dividiram em duas grandes correntes. Uma foi denominada científica, por buscar novos conhecimentos por meio de um processo rigoroso e experimental. O interesse principal desse grupo de pesquisadores – encabeçado por Edward Thorndike – estava relacionado à validação de que adultos eram capazes de aprender. 

Um segundo grupo baseou-se no trabalho do filósofo da educação John Dewey e foi denominado corrente artística. Ela se fundamentava na intuição e na análise de experiência para construir novos conhecimentos. Seu ponto de vista estava direcionado ao modo como adultos aprendem. É dessa corrente que Lindeman fazia parte. 

Conforme Knowles, é possível definir o que é ser adulto em quatro formas. A mais óbvia é a biológica, que pode ser definida a partir do momento em que há maturidade reprodutiva, portanto, no início da adolescência. Há também a definição legal, quando o jovem passa a ter direito de dirigir ou votar. Do ponto de vista social, somos adultos quando assumimos papéis destinados a esse grupo, como trabalhar ou morar sozinho. Psicologicamente, somos adultos quando nos reconhecemos como autossuficientes, capazes de dirigir nossa própria vida. Para a aprendizagem, essa é a definição mais importante. Por isso, o ponto central da andragogia é a autonomia do aprendiz. 

“Adultos aprendem conhecimentos, compreensões, habilidades, valores e atitudes de maneira mais eficaz quando são apresentados, no contexto de aplicação, a situações da vida real”, diz Malcolm Knowles. Especialmente na área de negócios, muitas vezes os cursos se baseiam em realidades distantes da nossa. Cases de empresas nos Estados Unidos, Japão, Índia ou lista de melhores práticas de startups só servirão para o seu processo de desenvolvimento se você conseguir fazer uma tradução da aplicação do aprendizado para o seu cotidiano. 

Capítulo 8 – A autodireção do aprendizado 

Van Gogh soube como poucos de sua época criar o próprio caminho de aprendizado. Quando conheci um pouco desse aspecto da vida dele, fiquei impressionado com o modo como utilizou todas as fontes de aprendizagem que proponho neste livro. Eu as descrevo com as iniciais CEP+R. Em primeiro lugar, bebeu conteúdos importantes e diversos por meio de livros e cursos ao longo de toda a sua vida. A base de formação de seu estilo deu-se por experiência, sobretudo em suas viagens para vários países. Soube também reconhecer a importância de outras pessoas para sua formação, especialmente seu irmão e os pintores à sua volta. Finalmente, sempre buscou construir redes, como na comunidade que tentou estabelecer no final de sua vida. 

Afinal, o que é aprendizagem autodirigida? 

Knowles, o pai da andragogia e sobre quem falamos anteriormente, produziu uma das definições mais utilizadas. Eu a utilizo porque ela tem também a vantagem de ser clara: aprendizagem autodirigida é um processo pelo qual indivíduos têm a iniciativa, com ou sem ajuda de outros, de diagnosticar suas necessidades de aprendizado, estabelecer metas e identificar recursos humanos e materiais para o aprendizado, escolhendo e implementando estratégias de aprendizado apropriadas e avaliando o resultado de seu aprendizado. 

Um relatório recente do Fórum Econômico Mundial apresentou o aprendizado autodirigido como um dos temas para se preparar para 2025. Para a entidade, essa habilidade é composta por duas outras. Uma é o aprendizado ativo, definido como a “capacidade de compreender as implicações de novas informações para a resolução de problemas e tomadas de decisões atuais e futuras”. Outra são as estratégias de aprendizagem, que se refere à “capacidade de selecionar e usar métodos de treinamento/instrução e procedimentos apropriados para a situação ao aprender ou ensinar coisas novas”. 

Minha experiência com participantes diversos tem me deixado cada vez mais convencido de que, uma vez que compreendemos o potencial da autodireção e começamos o processo, há uma transformação. Há também uma sensação de plenitude, não queremos mais parar. Existe um motivo para isso. Aprendizado, quando é conduzido com autonomia e vontade, é uma das principais fontes de motivação e bem-estar psicológico da espécie humana. 

Capítulo 9 – Aprendizado informal 

Aprendizado formal é toda iniciativa que ocorre dentro de um ambiente oficial e reconhecido. Pode ser pelo Estado, por entidades setoriais ou mesmo por empresas. Esse tipo é mais próximo do que chamamos de educação. É um sistema heterodirigido, hierárquico, com certificação de conhecimento. 

Outra categoria é o aprendizado não formal. Ele é composto por todas as ações de aprendizagem com algum grau de estruturação, mas que possuem mais liberdade e fluidez do que o formal: cursos livres, ensino de idiomas, aulas de pilates etc. 

A partir dessas definições, fica mais fácil dizer o que é aprendizado informal. É qualquer iniciativa que não se encaixe nelas. Uma iniciativa espontânea não estruturada que pode acontecer em qualquer lugar, com ou sem nossa consciência. Ela ocorre em todos os contextos da vida cotidiana; em uma conversa, no nosso trabalho. 

Há dois aspectos fundamentais nesse tipo de aprendizado. Ele pode ocorrer sem nossa intenção nem nosso conhecimento. Este é um ponto de atenção enorme e talvez a principal mudança necessária para o lifelong learner. A busca intencional do espaço informal deve ser parte de qualquer estratégia de aprendizado ao longo da vida. A consciência é o segundo ponto de atenção. De maneira geral, temos que colocar uma lente que permita ficarmos atentos às oportunidades que acontecem no nosso dia a dia. 

As organizações, por sua vez, ainda operam num sistema de comando e controle. Nele, faz mais sentido organizar treinamentos que têm pouca efetividade, mas podem ser supervisionados e quantificados pelas empresas. A definição de temas, atividades e datas pode gerar gráficos de dados que na verdade são pouco relevantes, como de presença ou avaliação do treinamento. Isso está mudando. A ineficácia das ações formais nas empresas já é consenso. Uma nova cultura de aprendizagem está surgindo de maneira acelerada no contexto corporativo também. 

Vale lembrar que você é adulto, e não um estudante grande. Você é autodirigido, pode conduzir seus projetos de aprendizagem. E o ambiente informal é o verdadeiro espaço de crescimento e desenvolvimento. 

Capítulo 10 – A primeira escolha 

Minha questão principal com essas listas de habilidades é que em geral convertem a habilidade – que, em definição, é uma ação – em um tema ou assunto. Por exemplo, pensamento analítico é a principal habilidade para 2025, de acordo com a lista publicada em 2020 pelo Fórum Econômico Mundial. Qual seria o primeiro passo para aprender sobre esse tema? Ouso dizer que a tendência é ler um livro, participar de um webinar ou de um curso mais longo. 

Contudo, para transformar essas informações, precisamos saber também as ações relacionadas a esse tema. No próprio relatório, há um anexo detalhando cada termo. Quando eles dizem “pensamento analítico”, estão se referindo à “análise de informações e ao uso de lógica para resolver problemas e questões relacionados ao trabalho”. Escrito desse jeito, conseguimos entender claramente o tipo de atividade no qual devemos nos aprimorar se queremos ter pensamento analítico. Portanto, um conteúdo muito amplo ou dissociado de uma ação não é um bom tema para um projeto de aprendizado. 

Resumidamente, proponho os seguintes passos para pavimentar o caminho da escolha do que aprender nas suas jornadas de aprendizado: 

  1. Olhar para dentro: entender quais são as suas necessidades de aprendizagem. 
  2. Olhar para fora: compreender um pouco mais o universo dos assuntos relacionados ao seu projeto. 
  3. Escolha do tema: listar e definir temas que podem ajudar na sua necessidade de aprendizado. 
  4. Do tema para a ação: entender o que você quer aprender a fazer melhor. 
  5. Do como para o porquê: uma vez que você escolha o que quer aprender, vale a pena verificar o motivo. 

Capítulo 11 – Conteúdo 

Meu processo de busca de conteúdo se baseia em três grandes frentes. A primeira é o velho e bom site de buscas. Ter domínio das diversas formas de se pesquisar na plataforma vai te ajudar muito nessa fase do projeto. Eu poderia dar mais uma série de dicas aqui, mas vou me limitar a uma. Faça uma busca com a seguinte frase: “Como fazer pesquisa no Google”. Garanto que, em meia hora, você saberá o que precisa saber. 

Minha segunda fonte de pesquisa de conteúdo são as redes sociais. O uso principal que faço delas está relacionado à curadoria de aprendizagem. É por meio delas que identifico uns 80% dos vídeos, artigos e livros que leio. O início é sempre simples. Identifico os autores e consultorias que escrevem sobre o assunto. 

A terceira fonte são as pessoas. Amigos, amigos de amigos ou contatos na internet para os quais você tenha a cara de pau de mandar uma mensagem e pedir algumas indicações. Sempre tive um ótimo índice de respostas ao enviar e-mails para professores de faculdades e autores de livros. Além das grandes referências, vale a pena estar atento ao conhecimento das massas. Ele está presente em plataformas como Quora, Medium e blogs pessoais. 

Eventos globais, em sua maioria, oferecem também conteúdo de qualidade. O TED Talks é um grande exemplo, tanto pela qualidade quanto pela quantidade de vídeos que oferece em seu site. Se você descobrir algum congresso relacionado ao tema de seu projeto, faça uma busca na página do organizador ou mesmo em plataformas de vídeo. 

Capítulo 12 – Experiência 

Para David A. Kolb, aprender é um processo em que o conhecimento é criado por meio da transformação da experiência. Inspirado pelas obras de grandes referências na área como Dewey, Piaget e Kurt Lewin, ele criou o Ciclo de Kolb, uma forma prática de demonstrar como ocorre o processo do aprendizado experiencial. 

Para Kolb, tudo começa com uma experiência concreta. Vivenciamos algo que nos gera curiosidade, encantamento ou estranhamento. O segundo ponto é a observação reflexiva: o que aconteceu? Por que aconteceu? Qual o impacto para mim, para outros e para o ambiente? Como resultado, criamos um conceito abstrato ou uma teoria sobre nossa experiência vivida. A última etapa é a experimentação ativa, que é o momento no qual aplicamos nossa hipótese em outra situação real e reiniciamos o ciclo, que assume uma forma de espiral; passamos pelo mesmo ponto, mas com um ponto de vista diferente do que iniciamos. 

Viver a experiência de cabeça e coração abertos é um passo importante para o aprendizado. Contudo, ele pode ser potencializado se dermos o segundo passo: investir tempo refletindo sobre o que aprendemos. 

Não sei se é o excesso de ofertas de conhecimento, mas vivemos uma época em que o tempo é um dos recursos mais disputados. Isso não deve ser empecilho: projetos de aprendizagem demandam um compromisso semanal de algumas horas, pelo menos, e devem fazer parte de sua rotina. Mas é importante usar esse tempo de maneira adequada aos seus objetivos. Muitas vezes, na etapa de planejamento, considerando as quatro fontes de aprendizagem, o CEP+R, percebo uma tendência de concentração exclusiva no conteúdo. Com isso, aspectos fundamentais do processo são negligenciados. 

Capítulo 13 – Pessoas e redes 

Ao longo da vida, vamos descobrindo a potencialidade em grupo. Contudo, se queremos realmente nos aprofundar em algum assunto, nos isolamos. Muitas vezes, o isolamento ajuda o foco e pode, portanto, ser positivo para a reflexão e compreensão profunda. Marcelle Xavier, especialista em comunidade, fundadora do Instituto Amuta e uma grande parceira nos projetos da novi [que tem o autor da presente obra como cofundador], tem dedicado seu tempo a pesquisar sobre comunidades. Foi ela que me ensinou o pouco que sei sobre thinking environment, conceito de Nancy Kline. Os estudos desse método apontam que nossa capacidade de pensar pode ser potencializada quando estamos pensando na companhia de outras pessoas. 

Por isso, ignorar outras pessoas como fontes de aprendizagem é um desperdício desnecessário, especialmente no século XXI, quando o acesso e o contato com pessoas e redes são tão facilitados e estimulados. 

 Identifico algumas posturas e hábitos que podem tornar a troca de palavras de aprendizagem ainda mais proveitosa. Um primeiro passo é a escolha de pessoas que você acredita que podem ajudar o seu projeto de aprendizagem. O processo de busca envolve conhecimento, coragem, e às vezes, um pouco de cara de pau. Na minha opinião, pessoas gostam de ajudar outras pessoas e sentem-se orgulhosas por quererem ser ouvidas.  

Capítulo 14 – Aprendizado em ação 

Imagine a seguinte situação. Você definiu que quer aprender um pouco mais sobre como a inteligência artificial pode automatizar processos da sua área de atuação. Por onde começar? Antes de comprar o primeiro livro ou se matricular em um curso online, vale a pena dedicar tempo estruturando sua lista inicial de fontes de aprendizagem. Ao longo da etapa de experimentação que descrevi acima, você já começará a encontrar algumas. Por isso, recomendo que você comece a criar um pequeno catálogo das suas fontes: conteúdos em diversos formatos e abordagens, experiências práticas que possam ajudar o seu ganho de conhecimento e de prática e pessoas e redes que compartilham do seu interesse ou possuem mais conhecimento do que você na área. Essa lista vai crescer ao longo do projeto. Contudo, não se obrigue a segui-la à risca. É mais importante estruturar e conectar o conhecimento e as reflexões que cada fonte traz. Por isso, esse é um bom momento para você definir como vai organizar o conhecimento do seu projeto de aprendizagem. 

Tenho uma sugestão de como fazer isso: crie um commonplace book. Esse é o nome pomposo de algo extremamente simples e poderoso. É o local – físico ou digital – escolhido para consolidar suas ideias, citações, histórias, informações e observações que encontrará ao longo do processo. Talvez você já tenha visto os cadernos de Leonardo da Vinci. Ele era um grande usuário de commonplace para fazer anotações, desenhos e registrar informações que poderiam ser úteis em alguma das diversas áreas em que atuava. É um diário do seu aprendizado. 

Lembrete 

Aprender é nos dar uma segunda chance. 

Ao investir tempo no nosso desenvolvimento, podemos descobrir interesses que não imaginávamos, caminhos que estavam escondidos e possibilidades que nos tornam melhores e mais felizes. 

Não perca essa oportunidade. 

Desafie-se e divirta-se. 

Resenha: Rogério H. Jönck

Fotos: Dmitry Ratushny, Redd, Praveen Gupta, Dmitry Ratushny / Unsplash

Ficha técnica: 

Título: Lifelong learners – O poder do aprendizado contínuo  

Autor: Conrado Schlochauer 

Primeira edição: Gente Editora 

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