Como dominar a crença doentia na própria importância e se preparar preparar para os momentos de fracasso cultivando força e coragem, na visão de um dos autores mais cultuados entre os técnicos de futebol americano
Ideias centrais:
1 – Esse é o objetivo da tela em branco: alcançar ajudando os outros. Fazer um esforço focado para trocar a gratificação de curto prazo por compensação de longo prazo. Deixe que os outros recebam crédito sobre o crédito e você acumule juros sobre o montante principal.
2- O ego é seu próprio pior inimigo. Ele também machuca as pessoas que amamos. Nossas famílias e amigos sofrem por causa dele. O mesmo acontece com nossos clientes e fãs. Um crítico de Napoleão foi preciso ao afirmar: “Ele despreza a nação, cujo aplauso busca”.
3 – É fácil ter uma ambição incansável, qualquer um pode pisar fundo no acelerador. A complacência é fácil, é só tirar o pé do acelerador. Precisamos evitar o que o especialista em gestão de negócios Jim Collins chama de “busca desenfreada por mais”.
4 – Prepare-se. Incompreensões, dúvidas podem acontecer. Talvez seus pais nunca se impressionem. Pode ser que sua namorada não dê a mínima. Talvez o investidor não enxergue os números. É possível que a plateia não aplauda. Não podemos deixar isso ser nossa motivação.
5 – Por oito anos inteiros, Churchill enfrentou praticamente sozinho seus colegas de visão limitada e a ameaça crescente do fascismo, mesmo no Ocidente. Mas, no final das contas, ele saiu triunfante mais uma vez. E voltou a enfrentar a adversidade. E foi, novamente, vitorioso.
Sobre o autor:
Ryan Holiday é especialista em manipulação midiática, tornando-se diretor de marketing de uma antiga marca de vestuário American Apparel. O Obstáculo é o caminho, um de seus livros publicados, foi traduzido para 17 idiomas. É cultuado entre técnicos de futebol americano.
Introdução
O ego ao qual nos referimos com maior frequência tem uma definição mais casual: uma crença doentia na própria importância. Arrogância. Ambição egocêntrica. Esta é a definição que este livro usará. É aquela criança petulante dentro de cada um, que prefere fazer as próprias vontades acima de tudo ou de qualquer pessoa. A necessidade de ser melhor do que, mais do que, reconhecido por, muito além de qualquer utilidade plausível – isso é o ego. É o senso de superioridade e de certeza que ultrapassa os limites da autoconfiança e de talento.
O pioneiro CEO Harold Geneen comparou o egocentrismo ao alcoolismo: “O egocêntrico não tropeça, derrubando as coisas da mesa. Ele não gagueja, não baba. Não; em vez disso, ele se torna cada vez mais arrogante, e algumas pessoas, sem saber o que há por trás dessa atitude, confundem sua arrogância com autoridade e autoconfiança.” Pode-se dizer que eles próprios começam a fazer essa confusão, sem perceber a doença que contraíram ou que estão se matando por causa dela.
As maneiras como essa separação se manifesta de modo negativo são infinitas, quando construímos muros. Não podemos melhorar o mundo se não entendemos nem a ele, nem a nós mesmos. Não podemos aceitar ou receber feedback quando somos incapazes de ouvir fontes externas ou não temos interesse nisso. Não conseguimos identificar oportunidades – ou criá-las – se, em vez de enxergarmos o que está diante de nós, vivemos dentro da nossa própria fantasia. Sem uma comparação acurada entre nossas habilidades e a dos outros, o que temos não é autoconfiança, mas ilusão.
Assim este livro é organizado em três partes: Aspiração, Sucesso e Fracasso.
O objetivo dessa estrutura é simples: ajudar a sufocar o ego antes que maus hábitos se consolidem; substituir por humildade e disciplina as tentações do ego que surgirem quando experimentamos o sucesso; e cultivar força e coragem, de modo que, quando o destino se voltar contra você, você não seja arruinado pelo fracasso. Resumindo, essa estrutura poderá nos ajudar a ser:
- Humildes em nossas aspirações;
- Generosos em nossos sucessos;
- Resilientes em nossos fracassos.
PARTE I – ASPIRAÇÃO
Isócrates queria que o filho fosse “afável em seu trato com aqueles que o abordarem, e jamais soberbo; pois que até os escravos têm dificuldade de suportar o orgulho do arrogante” e “lento na deliberação, mas rápido na execução de suas decisões”, acrescentando que “a melhor coisa que temos em nós é o bom julgamento”. Treine constantemente seu intelecto, ele instruiu, “pois o que há de mais grandioso na menor das bússolas é uma mente sã em um corpo humano”.
É possível que alguns desses conselhos soem familiares, já que dois mil anos depois eles chegaram a William Shakespeare, que costumava alertar contra o ego desenfreado. Usando essa mesma carta como modelo em Hamlet, Shakespeare coloca as palavras de Isócrates na boca do personagem Polônio em um diálogo com seu filho Laertes. O discurso, caso você não conheça, termina com esta pequena estrofe:
E, acima de tudo, sê fiel a ti mesmo
Pois então, como a noite e o dia
Tu não poderás ser falso para com homem nenhum.
Adeus. Que minha bênção amadureça isso em ti.
As palavras de Shakespeare, por sua vez, chegaram a um jovem oficial militar dos Estados Unidos chamado Tecumseh Sherman, que viria a se tornar talvez o maior general estrategista daquele país. É possível que ele nunca tenha ouvido falar de Isócrates, mas amava a peça e inúmeras vezes citou esse mesmo discurso.
Beneficiando-se da grande escassez de lideranças, ele foi promovido a general de brigada e convocado para uma reunião com o presidente Lincoln e seu principal conselheiro militar. Porém, em diversas ocasiões, Sherman exibiu autonomia suficiente para traçar estratégias e planos diretamente junto ao presidente, mas no final da viagem fez um estranho pedido: só aceitaria a promoção com a garantia de que não teria de assumir um cargo mais alto na hierarquia. Lincoln poderia lhe dar sua palavra em relação a isso? Com todos os outros generais pedindo as maiores patentes e o máximo possível de poder, o presidente concordou de bom grado.
Seu senso de realidade lhe permitiu ver um caminho através do Sul que os outros julgavam impossível. Toda a sua teoria de guerra de manobra repousava na decisão de evitar deliberadamente ataques frontais ou demonstrações de força na forma de batalhas campais, bem como ignorar as críticas feitas com o objetivo de provocar uma reação.
O que vemos em Sherman é a conexão profunda de um homem com a realidade. Era um homem que veio do nada e realizou coisas grandiosas, sem nunca considerar as honras que recebeu como um direito seu. Na verdade, ele costumava ceder as honras aos outros, e estava mais do que satisfeito em contribuir com um time vencedor, mesmo que isso implicasse em menos crédito ou fama para si mesmo.
A flexibilidade estratégica não é o único benefício do silêncio enquanto os outros tagarelam. Também a psicologia. O poeta Hesíodo tinha isso em mente quando disse: “O maior tesouro de um homem é uma língua econômica.” A fala nos exaure. Falar e fazer brigam pelos mesmos recursos. Pesquisas mostram que, depois de algum tempo, nossa mente começa a confundi-la com o progresso propriamente dito.
Kirk Hammett procurou um professor de guitarra. Em outras palavras, apesar de ter entrado para o grupo de seus sonhos e de ter realmente se tornado um profissional, ele insistia que precisava de mais instrução – que ainda era aprendiz. O professor que ele procurou era famoso por ser o mestre dos mestres e por ter trabalhado com prodígios musicais como Steve Vai.
Joe Satriani, o instrutor, esclarece o que faltava a Hammett – certamente não talento. “O principal lance com Kirk (…) era que ele era um guitarrista muito bom quando chegou (…), já era solista. Tinha uma ótima mão direita, conhecia a maioria dos acordes, mas não tinha aprendido a tocar em um ambiente que lhe ensinasse todos os nomes e não sabia como conectar tudo.”
O poder de ser um grande aprendiz não significa apenas um período prolongado de instrução, mas também colocar o ego e a ambição nas mãos de outras pessoas. Um teto é imposto ao ego, pois o indivíduo sabe que não é melhor do que o “mestre” com quem aprende. Não dá para “trapacear” em um processo educativo, não existe outro atalho a não ser aprender todos os dias. Se você não aprender, está fora.
Não gostamos de pensar que alguém é melhor do que nós. Ou que ainda temos muito a aprender. Queremos pensar que chegamos ao fim de nosso aprendizado. Queremos estar prontos. Estamos ocupados e sobrecarregados.
Não há uma coisa que essas pessoas não lhe disseram: sua paixão pode ser exatamente o que impede você de alcançar o poder, a influência ou o sucesso. Pois muitas vezes nós falhamos mesmo com — ou melhor, por causa da – paixão.
A paixão costuma mascarar a fraqueza. Sua impetuosidade, seu frenesi e sua capacidade de nos tirar o fôlego são substitutos medíocres da disciplina, da maestria, da força, do propósito e da perseverança. Você precisa ser capaz de identificar essas características nos outros e em si mesmo porque, embora as origens da paixão possam ser sinceras e bem-intencionadas, seus efeitos são cômicos e monstruosos.
Quando alguém consegue o primeiro emprego ou entra para uma nova organização, muitas vezes recebe o seguinte conselho: ajude os outros a construírem uma boa imagem, e vai se dar bem. Abaixe a cabeça, dizem as pessoas, e obedeça a seu chefe. Naturalmente, não é isso que o jovem, que foi escolhido entre todos os outros para a posição, quer ouvir. Não é o que um aluno de Harvard espera – afinal de contas, ele estudou exatamente para evitar essa suposta indignidade.
Vamos reformular para que a situação não pareça tão humilhante: a questão não é puxar o saco de ninguém. É fornecer o apoio necessário para que outros possam se sair bem. A melhor maneira de expressar esse conselho é: encontre telas em branco para outras pintarem. Seja um anti ambulante. Abra caminho para aqueles que estão acima de você, e acabará por criar o seu próprio caminho.
Esse é o objetivo da estratégia da tela em branco: alcançar o sucesso ajudando os outros. Fazer um esforço focado para trocar a gratificação de curto prazo por compensação de longo prazo. Enquanto todo mundo quer receber crédito e ser “respeitado”, você pode esquecer o crédito. Pode esquecê-lo de tal maneira que ficará feliz quando outros o receberem em seu lugar: essa, no final das contas, é sua meta. Deixe que os outros recebam crédito em cima de crédito enquanto você adia o recebimento e acumula juros sobre o montante principal.
Em outras palavras, identifique oportunidades de promover a criatividade dos outros, encontre meios e pessoas para gerar colaboração e elimine distrações que atrapalhem o progresso e o foco dessas pessoas. Essa é uma estratégia de poder gratificante e sua escala é infinita. Considere cada passo um investimento em relacionamentos e em seu próprio desenvolvimento.
Quando Branch Rickey, o técnico e proprietário dos Brooklyn Dodgers, identificou em Jackie Robinson o potencial para ser o primeiro jogador negro de beisebol, ele tinha uma pergunta: você tem coragem? “Estou procurando”, disse Rickey a ele, “jogador de beisebol com coragem o suficiente para não reagir.” Na verdade, em seu famoso encontro, Rickey simulou os insultos que Robinson provavelmente sofreria se aceitasse o desafio proposto: um gerente de hotel recusando-se a lhe dar um quarto, um garçom grosseiro em algum restaurante, um oponente gritando ofensas. Robinson garantiu que estava pronto para lidar com isso. Rickey poderia ter escolhido muitos jogadores, mas precisava de alguém que não deixasse o ego impedi-lo de enxergar o quadro geral.
Quando começou nas equipes de base do beisebol, em seguida passando para as profissionais, Robinson enfrentou mais do que o mero desprezo de prestadores de serviços. Havia uma campanha agressiva e coordenada para difamá-lo, atacá-lo. Ainda assim Jackie Robinson manteve o pacto verbal feito com Rickey.
O orgulho pega uma conquista desimportante e faz com que pareça um grande feito. Ele se deleita com nossa suposta esperteza e talento, como se o que já exibimos não passasse de uma vaga ideia do que está por vir.
Orgulho e o ego dizem:
- Sou um empreendedor porque comecei sozinho.
- Vou vencer porque, no momento, estou na frente.
- Sou um escritor porque publiquei algo.
- Sou rico porque ganhei algum dinheiro.
Toda cultura parece produzir palavras que alertam contra isso. Não conte com o ovo que a galinha ainda não botou. Não coloque o carro na frente dos bois. Não atire foguetes antes da festa.
PARTE II – SUCESSO
Se alguém estivesse procurando uma metáfora pungente para o ego e a destruição, seria difícil de encontrar algo melhor do que a imagem de alguém trabalhando furiosamente com uma das mãos em direção a uma meta e a outra se esforçando igualmente para sabotá-la.
Como todos nós, Howard Hughes não era completamente louco nem completamente são. Seu ego, alimentado e exacerbado por enfermidades físicas (a maioria proveniente de acidentes aéreos e automobilísticos causados por ele mesmo) e vários vícios, o conduziu a uma escuridão muito difícil de compreendermos.
O sucesso é intoxicante. No entanto, sua manutenção requer sobriedade. Não podemos continuar aprendendo se pensarmos que já sabemos tudo. Não podemos nos deixar levar por mitos que nós mesmos criamos, ou pelo ruído e pelo falatório do mundo exterior. Precisamos entender que não passamos de uma pequena parte de um universo interconectado. Acima de tudo, precisamos construir uma organização e um sistema em torno do que fazemos – cujo foco seja o trabalho, e não nós mesmos.
Este é o veredicto de Hughes: ele foi destruído pelo ego. Um julgamento semelhante espera por nós em algum momento. Ao longo de sua carreira, você irá se deparar com as mesmas escolhas que ele teve de fazer – que todas as pessoas precisam fazer.
Quando obtemos nossas primeiras conquistas, nós nos surpreendemos com novos problemas. O soldado recém-promovido deve aprender a arte da política. O comerciante, a gerenciar. O criador, a delegar. O escritor, a editar os outros. O comediante, a atuar. O chef que se torna dono de restaurante, a administrar o outro lado da casa.
Dá um calafrio pensar nas forças vitais sendo sugadas desse herói, derrotado e em agonia. Um homem íntegro e honesto, que simplesmente não conseguiu manter o foco e acabou muito longe dos limites de seu imenso gênio. Não que [general] Grant tenha sido o único a passar por isso. Todos nós regularmente dizemos “sim” sem pensar, seja por uma vaga atração, por ganância ou vaidade. Porque não conseguimos dizer “não” – pois, se dissermos, podemos perder alguma coisa.
Não importa se você é um bilionário, um milionário ou só um garoto que conseguiu um bom emprego cedo. A total e absoluta autoconfiança que o trouxe até aqui pode se tornar um grande risco se você não tiver cuidado. Sabe os anseios e os sonhos que você tinha a respeito de uma vida melhor? E a ambição que alimentou seu esforço? Eles começam como motivações legítimas, mas, se não forem controlados, tornam-se excesso de segurança e arrogância.
O ego é seu próprio pior inimigo. Ele também machuca as pessoas que amamos. Nossas famílias e amigos sofrem por causa dele. O mesmo acontece com nossos clientes e fãs. Um crítico de Napoleão não poderia ter sido mais preciso ao afirmar: “Ele despreza a nação cujo aplauso busca.” Napoleão não conseguia ver os franceses de outro modo a não ser como peças a serem manipuladas, pessoas em relação às quais precisava ser melhor, pessoas, que, se não o apoiassem completa e incondicionalmente, estavam contra ele.
Uma pessoa inteligente deve sempre se lembrar dos limites do próprio poder e alcance.
Depois que um time começa a obter vitórias e a ganhar atenção da mídia, os vínculos simples que uniam os indivíduos vão se desfazendo. Os jogadores calculam a própria importância. Seu peito infla. Surgem frustrações. Os egos emergem. A “Escalada inocente”, de acordo com Pat Riley, é quase sempre sucedida pela “Doença do eu”. Ela pode “acometer qualquer time vencedor em qualquer ano e a qualquer momento”, e isso acontece com uma regularidade alarmante.
Marshall foi testado nesse aspecto até seu limite. A posição pela qual havia passado a vida lutando agora estava ao seu alcance: o comando das tropas no Dia D, essencialmente a maior invasão coordenada que o mundo já vira. Roosevelt deixou claro que o comando seria de Marshall, bastava ele querer. O lugar de um general na história é conquistado por seus feitos em batalha. Portanto, apesar de Marshall ser necessário em Washington, Roosevelt queria lhe dar a oportunidade de assumir o comando. Marshall não aceitaria. A tarefa e a glória foram para Eisenhower.
Existe um equilíbrio. O técnico de futebol Tony Adams expressa isso muito bem. “Jogue pelo nome na frente da camisa”, diz ele, “e as pessoas irão se lembrar do nome que está nas costas”.
Por que você acha que os grandes líderes e pensadores ao longo da história “saltam para a imensidão” e voltaram inspirados, com um plano, com uma experiência que os coloca em um curso que acaba por mudar o mundo? Foi porque, ao fazê-lo, eles encontraram perspectiva, entenderam o quadro geral de um modo que era possível na agitação da vida diária. Silenciando o barulho ao seu redor, eles enfim puderam ouvir a voz sussurrante que precisavam escutar.
A criatividade é uma questão de receptividade e reconhecimento. Isso não pode acontecer quando você está convencido de que o mundo gira ao seu redor.
A chanceler Angela Merkel é sóbria, enquanto muitos líderes estão inebriados – com o ego, o poder, a posição. Essa sobriedade foi precisamente o que fez dela uma líder bastante popular que já cumpre o terceiro mandato [já terminado] e, ainda, uma força poderosa e arrebatadora a favor da liberdade e da paz na Europa moderna.
É fácil ter uma ambição incansável, qualquer um pode pisar fundo no acelerador. A complacência também é fácil, é uma questão de tirar o pé do acelerador. Precisamos evitar o que o especialista em gestão de negócios Jim Collins chama de “busca indisciplinada por mais”, bem como a complacência que vem com os aplausos. Tomando emprestadas as ideias de Aristóteles, o que é difícil é aplicar a quantidade certa de pressão, na hora certa, da forma certa, pelo período de tempo, no carro certo e indo na direção correta.
PARTE III – FRACASSO
Nós todos lidamos com reveses ao longo do caminho. O ego não apenas impede que nos preparemos para essas circunstâncias, como muitas vezes contribui para sua ocorrência. A saída, o caminho para retomar o progresso, requer uma reorientação e mais autoconhecimento. Não precisamos de piedade – nem de nós mesmos nem de mais ninguém. Precisamos de propósito, equilíbrio e paciência.
Se já é exaustivo ler essa lista de problemas [de Graham], imagine vivê-los. No entanto, graças à perseverança de Graham, os resultados foram melhores do que qualquer pessoa poderia ter previsto.
Os documentos vazados publicados por Katharine Graham foram conhecidos como Papéis do Pentágono e se tornaram um dos acontecimentos mais importantes da história do jornalismo. A cobertura do caso Watergate feita pelo Post que tanto enfureceu a Casa Branca de Nixon mudou a história norte-americana e derrubou uma administração inteira. Também rendeu ao jornal um Prêmio Pulitzer. O investidor que os outros tanto temiam no final das contas era um jovem Warren Buffet, que se tornou mentor de Graham nos negócios, bem como um grande defensor e administrador da companhia. (Seus pequenos investimentos na empresa da família de Graham um dia valeriam centenas de milhões.)
Graham não causou o suicídio do marido, mas precisou seguir em frente sem ele. Ela não pediu por Watergate ou pelos Papéis do Pentágono, mas coube a ela atravessar sua natureza incendiária. Enquanto outros mergulhavam em surtos de compras e fusões nos anos 1990, Katharine não seguiu a tendência. Em vez disso, concentrou-se em si mesma e na própria empresa, apesar de Wall Street vê-la como uma companhia frágil. Ela teve a chance de optar pelo caminho fácil diversas vezes, mas não foi isso que fez.
Malcolm enfrentou o que Robert Greene – um homem que sessenta anos depois teria seus livros extremamente populares banidos em muitas prisões federais – chama de cenário “Tempo vivo ou tempo morto”. Como, afinal de contas, seriam aqueles anos de encarceramento? O que Malcolm X faria com esse tempo?
Como diria mais tarde: “Dali até o dia em que saí da prisão, em todo tempo livre que eu tinha, se não estivesse lendo na biblioteca, eu estava lendo em meu beliche.” Ele estudou história, sociologia, religião, leu os clássicos, filósofos como Kant e Spinoza. Posteriormente, um repórter perguntou a Malcolm: “Qual universidade você frequentou?” Ele deu uma palavra como resposta: “Livros.” A prisão foi sua faculdade.
Historiadores, estudiosos e artistas passaram séculos lamentando e discutindo o tratamento que Belisário recebeu. Como todos que têm senso de justiça, eles se sentem ultrajados pela estupidez, pela ingratidão e pela injustiça a que foi submetido esse homem grandioso e incomum.
Sabe quem foi a única pessoa que nunca reclamou disso? Nem uma única vez até o fim da sua vida, nem mesmo em cartas pessoais? O próprio Belisário. Sabia que havia feito o que era certo. Isso era suficiente.
Bem, prepare-se. Isso vai acontecer. Talvez seus pais nunca se impressionem. Pode ser que sua namorada não dê a mínima. Talvez o investidor não enxergue os números. É possível que a plateia não aplauda. Mas precisamos prosseguir. Não podemos deixar isso ser nossa motivação.
E nesses momentos – quando expuseram algo nunca antes visto – você foi forçado a olhar bem nos olhos de uma coisa chamada Verdade. Você não pôde continuar se escondendo ou fingindo.
Esses momentos levantam muitas questões. Como posso processar isto? Como sigo em frente e saio dessa? Isto é o fundo do poço, ou ainda falta? Alguém me mostrou meus problemas, e agora como posso resolvê-los? Como deixei isso acontecer? Como evitar que se repita?
Uma olhada na história mostra que esses eventos parecem ser definidos por três características:
- Eles quase sempre vêm pelas mãos de uma força ou de uma pessoa externa.
- Em vários casos, envolveram algo que já sabíamos sobre nós mesmos, mas que tínhamos muito medo de admitir.
- Da ruína veio a oportunidade para um grande progresso ou melhora.
Mas a mudança começa quando ouvimos as críticas e as palavras de quem convive conosco. Mas depois a sensação é uma das perspectivas mais fortes do mundo. O presidente Obama a descreveu da seguinte maneira quando chegou ao final de seus dois difíceis mandatos. “Desci as Cataratas do Niágara de barril e emergi, e sobrevivi, e essa é uma sensação libertadora.”
Quando o ego está no controle, quem consegue enxergar? Digamos que você tenha fracassado e que a culpa foi sua. Como se diz, merdas acontecem e, às vezes, elas acontecem em público. Não é divertido. Mas a questão permanece: você vai piorar tudo? Ou vai sair dessa com a dignidade e o caráter intactos? Vai sobreviver para enfrentar outro dia?
Todos nós passamos por experiências que nos deixam furiosos. Quanto mais bem-sucedidos e poderosos nos tornamos, acreditamos que é necessário proteger um número cada vez maior de coisas, pois só assim manteremos ileso nosso legado, imagem e influência. Se não formos cuidadosos, contudo, podemos acabar desperdiçando uma quantidade incrível de tempo ao tentar evitar que o mundo nos desagrade ou desrespeite.
Na biografia da vida de Winston Churchill escrita por William Manchester, o volume intermediário – o terceiro da coleção – é intitulado Alone [Sozinho]. Por oito anos inteiros, Churchill enfrentou praticamente sozinho seus colegas de visão limitada e a ameaça crescente do fascismo, mesmo no Ocidente. Mas, no final das contas, ele saiu triunfante mais uma vez. E voltou a enfrentar a adversidade. E foi, novamente vitorioso.
Todos os grandes homens e mulheres passaram por dificuldades para chegar onde estão, todos cometeram erros. Eles se beneficiaram de algum modo de suas experiências – mesmo que tenha sido simplesmente com a percepção de que não eram infalíveis e de que as coisas nem sempre acontecem como querem.
O mantra deles para nos guiar é:
Não buscar nem aspirar a algo motivado pelo ego.
Ter sucesso sem o ego.
Superar o fracasso com a força e não com o ego.
Resenha: Rogério H. Jönck
Fotos: reprodução e Tuva Mathilde Løland, Brett Jordan, mariel reiser / Unsplash
Ficha técnica:
Título: O ego é seu inimigo – Como dominar seu pior adversário
Título original: Ego is the enemy
Autor: Ryan Holiday
Primeira edição: Intrínseca