Por Ricardo Natale.
Quinta geração de telefonia deve movimentar US$ 25,5 bilhões, mas potencial tende a ser muito maior, se a tecnologia conseguir conectar os 75 milhões de brasileiros que ainda estão à margem da digitalização do país.
As operadoras de telefonia têm até julho próximo para ativar o sinal de 5G nas 26 capitais do país e no Distrito Federal. Assim como o 4G trouxe maior velocidade e qualidade às conexões à internet, a nova tecnologia de transmissão de dados será fundamental para que a realidade virtual e aumentada e o metaverso avancem. Também propiciará várias outras oportunidades de negócios. Segundo um estudo realizado em parceria entre a consultoria IDC e o Instituto IT Mídia, o 5G pode movimentar US$ 25,5 bilhões até 2025.
A chegada do 5G divide a opinião de especialistas. Por um lado, deve acelerar a transformação digital, barateando produtos e serviços. Mas já se discute o risco do aumento do fosso digital entre bairros e regiões mais ricas. Para municípios com mais de 30 mil habitantes, por exemplo, o prazo de implantação da nova tecnologia é julho de 2029. E estima-se que as frequências ocupadas com a quinta geração de telefonia celular só estejam disponíveis na maior parte dos bairros das grandes cidades dentro de, pelo menos, quatro anos.
Mesmo às vésperas da entrada em operação do 5G, parcela significativa dos brasileiros continua à margem da crescente transformação digital verificada em todo o planeta, acelerada nos dois últimos anos em decorrência da pandemia de covid, como demonstra um levantamento conduzido pelo Instituto Locomotiva em colaboração com a consultoria PwC, intitulado “O abismo digital no Brasil”.
O estudo identificou que, no Brasil, 81% da população com 10 anos ou mais usam a internet, mas somente 20% têm acesso de qualidade à rede. Há diferenças marcantes no acesso à internet entre os extremos das classes de renda (100% na classe A, em comparação com 64% na DE) e entre negros e não negros. Em termos educacionais, o índice de conexão é maior entre estudantes de escolas privadas, o que acentuou o déficit de ensino durante a crise sanitária. E apenas 8% dos internautas plenamente conectados pertencem às classes DE, enquanto entre os desconectados eles são 60%.
Em outras palavras, isso significa que há 33,9 milhões de brasileiros desconectados da web (pessoas não alfabetizadas das classes C, D e E e idosos). Outros 41,8 milhões estão na faixa que o levantamento classifica como subconetados. Localizam-se principalmente no Norte e Nordeste, usam celular pré-pago, são poucos escolarizados, a maioria negra, e se concentram nas classes D e E.
Os parcialmente conectados somam 44,8 milhões, moram predominantemente no Sudeste, são negros e das classes C, D e E. E há 49,4 milhões plenamente conectados, nas Regiões Sul e Sudeste, que usam celular pós-pago ou notebooks para acessar a internet. Têm boa escolaridade, em sua maioria são brancos e das classes A e B.
Ao buscar as razões da desigualdade de acesso, o Instituto Locomotiva e a PwC encontraram três fatores básicos: deficiências da infraestrutura de conexão, limitações de acesso a hardware e deficiências do sistema educacional.
O celular é o dispositivo de acesso à internet mais comum entre os brasileiros: 99% dizem usar o aparelho com essa finalidade. Para 58% dos usuários no país, o celular é o único meio de acesso à internet. Esse uso exclusivo do aparelho aumenta entre os indivíduos de renda mais baixa e os negros, o que revela o impacto do custo do hardware e dos serviços de banda larga nas escolhas sobre os meios de conexão.
Especificamente sobre os efeitos da digitalização no mercado de trabalho, em recente artigo publicado na EXP, Gustavo Glasser, CEO da Carambola, cita um mapeamento conduzido pela McKinsey & Company e repercutido pelo Fórum Econômico Mundial, o qual apontou que nove em cada dez organizações — de um universo de 100 empresas de vários países — estão mudando para o modelo híbrido, ou seja, combinando o trabalho remoto com o presencial.
A decisão de enxergar o futuro do trabalho com esse cenário misto, de acordo com a análise, tem por base o resultado entregue pelos profissionais durante a pandemia: as companhias viram a produtividade individual aumentar e, com ela, subiu o índice de satisfação dos clientes.
O outro lado da moeda, entretanto, demanda pensar de forma mais crítica sobre as diferentes realidades socioeconômicas dos colaboradores. “Nivelar por cima — com gestores de recursos humanos pensando que todos têm os recursos (financeiros e de infraestrutura) para desenvolver as atividades profissionais remotamente — é de uma cegueira social impressionante”, escreveu Glasser. “Esse futuro híbrido pode tornar o mundo do trabalho ainda mais excludente e pouco diverso!”
É papel de todo o mercado entrar no esforço para a democratização do 5G, porque a competividade das empresas e a expansão do mercado consumidor abrem um mar de oportunidades do qual a economia brasileira não pode ficar de fora.
Seja qual for o padrão de transmissão de dados, não se pode deixar de lado a discussão sobre o enorme contingente de cidadãos desplugados e o que se pode fazer para incluí-los de forma decente no mundo digital. Quanto o país poderia crescer e aumentar sua competitividade se conectasse 100% dos brasileiros?