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Magalu x Centauro e os quatro tropeços da Netshoes

Uma disputa acirrada movimenta o e-commerce brasileiro nos últimas dias. Depois e o Magazine Luiza ter negociado a compra da Netshoes, em 29.04, por US$ 62 milhões (cerca de R$ 245 milhões), ou US$ 2 por ação, a Centauro decidiu melar o jogo. A rede de roupas esportivas entrou na disputa em uma série de rodadas de ofertas que agora está em US$ 3,50, chegando a US$ 108 milhões.

Não importa qual seja o desfecho dessa contenda, a venda iminente representará uma pechincha se comparado à época em que Netshoes abriu capital, em abril de 2017, com cotação de US$ 16,35 (a ação chegou a bater US$ 26,73 em maio daquele ano). Desde então, a empresa, que foi considerada na ocasião o maior case de sucesso do varejo eletrônico brasileiro, seguiu em trajetória de queda até a venda. O prejuízo em 2018 foi de R$ 332 milhões, quase o dobro em relação ao ano anterior.

Ofertas das redes oscila em US$ 3,50, quando ação da Netshoes chegou a valer US$ 26,73 há dois anos.

Mas quais os motivos levaram o décimo comércio eletrônico mais popular do Brasil a acumular perdas tão significativas? Especialistas ouvidos pelo Experience Club destacam três principais “tropeços” que explicam o fim de jogo tão precoce da Netshoes.

1-Foco na velocidade, não na receita

Para Arthur Igreja, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em inovação, a estratégia de crescimento muito rápido não foi acertada. Segundo ele, a Netshoes quis ficar grande antes de ficar lucrativa, em uma época em que parecia que “todo mundo ia virar Amazon”.

“Foi uma aposta. Ela foi para o IPO com alguma velocidade. A premissa de crescer muito rápido e o tanto de capital que ela teve premiou este modelo de muito prejuízo ao longo do tempo, afastando qualquer chance de se tornar rentável. É uma marca forte, mas como negócio nunca parou de pé” dispara Igreja.

2-Excesso de alavancagem

Fundada em 2000 como loja física de calçados em São Paulo, pelos sócios Marcio Kumruianm e Hagop Chabab, a Netshoes migrou para a internet e virou um dos maiores cases de sucesso recente do e-commerce nacional.

Mas foi alavancada por uma estratégia agressiva de marketing e verticalização do seu negócio, que necessitou de altos investimentos, principalmente, em tecnologia. “Com isso, em certas linhas do DRE (Demonstrativo de Resultados no Exercício), acabou sendo menos eficiente, gerando um resultado negativo durante muito tempo”, comenta Felipe Dellacqua, Presidente da Associação Brasileira de E-commerce Cross-Border (ABRASECB) e VP de vendas da VTEX, multi-nacional de tecnologia para ecommerce omnichannel.

Para o presidente da ABRASECB, nesse ponto Netshoes caiu em descrença perante o mercado financeiro, “se realmente em algum momento conseguiria ser lucrativa”.

3-Falta de visão Omnichannel

Dellacqua destaca também a característica 100% online de Netshoes, em tempos de varejo cada vez mais multicanal. Acrescido pelo fato do segmento de calçados ter um índice de troca muito alto. “Pesou a questão da Netshoes ser um player sem lojas físicas, perdendo para a Centauro, sua principal concorrente no Brasil, [com vantagem] quando um cliente tinha a necessidade de buscar o produto em uma loja física e reduzindo assim o custo de troca e devolução”, diz.

4-Internacionalização precoce

Outro ponto foi a estratégia de expansão LATAM, para Argentina e México, que dividiu o tempo de foco de uma operação já complexa como o Brasil, com outros países não tã
o relevantes em relação ao comércio eletrônico. Em entrevista no final do ano passado, o CEO Marcio Kumruian, fundador e presidente da empresa, admitiu erros ao diversificar os negócios para outros mercados.

“Para qualquer empresa se internacionalizar não é fácil, seja pelos aspectos culturais ou por entender o mercado – e lembrando que ela não estava exatamente ‘bombando’ no Brasil. Muitas vezes, CEOs fazem isto até para justificar para o conselho que continuam crescendo, mas não, necessariamente, na direção correta. Foi um erro de estratégia”, analisa Igreja.

Magalu: eficiência entra campo

Os analistas também apontam vantagens para o Magazine Luiza na compra de Netshoes. A gigante do varejo vem acumulando resultados positivos – fechou 2018 com lucro de R$ 597,4 milhões, 53,6% maior que em 2017; o Ebidta cresceu 20,8%, passando a R$ 1,25 bilhão; e a receita líquida aumentou 30,1%, indo a R$ 15,6 bilhões.

Apesar da crise financeira que Netshoes vinha passando perante seus investidores, como marca do varejo para o consumidor final tem alto mindshare e marketshare no segmento de esportes e lazer, com alta excelência dos serviços.

“Magalu irá aportar sua eficiência operacional para levar à Netshoes uma operação lucrativa. E ser referência em duas categorias com grande crescimento no online que ainda não eram relevantes, como Moda e Esportes”, reforçou Delaqqua, em entrevista anterior à entrada da Centauro na negociação.

Magazine Luiza está em uma tendência de transformação digital há muito tempo e vai entrar com mais força em novos segmentos do e-commerce, lembra Igreja. “Ela está pagando barato em uma marca que é presente no varejo digital e vai conseguir fazer toda uma convergência de distribuição, ‘pisando’ mais no terreno de itens de consumo pessoal”, conta.

Vale ressaltar que a rede virou o ano com uma participação de 37,7% das vendas online no faturamento total, resultado que cresce ano a ano. Sobretudo com uma estratégia agressiva de crescimento como marketplace digital.

Por outro lado, a aquisição da Netshoes pela rival oferecerá uma estrutura muito forte de e-commerce para a Centauro, cujo modelo de negócio está centrado no varejo físico. Será uma maneira de a companhia queimar muitas etapas na disputa do mercado digital, contando com uma base gigantesca de novos clientes.

Texto: Andrea Martins

Imagens: Reprodução

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