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“Diversidade impulsiona resultado financeiro dos negócios”

Programas de aceleração como o Female Scale do Distrito, liderado por Lílian Natal, visam diminuir a desigualdade de gênero no empreendedorismo de inovação no país 

Quando tinha sua própria startup, Lílian Natal viveu na pele todas as dificuldades que as empreendedoras mulheres enfrentam para fazer a gestão do seu negócio. Perguntas detratoras em captações com investidores e pouca empatia e receptividade dos fundos de venture capital eram comuns nas rodas de pitch, em especial nas que ela fazia sem seus sócios homens. “A minha experiência de vida me fez ter certeza de que no Distrito uma das minhas missões seria a de impulsionar negócios de outras mulheres”, diz Lílian, líder de comunidade e do programa Distrito for Startups

Em 2021, o Distrito lançou o programa de aceleração Female Scale, que recebeu quase 400 inscrições de startups fundadas por mulheres. O programa tinha duas etapas e as dez empresas que mais tracionaram o negócio após uma imersão de doze semanas foram selecionadas para a última fase. Destas, as três startups vencedoras foram as fintechs ​​AkinTec e Idez, além da legaltech Verifact.   

Em entrevista ao Experience Club Lílian dá detalhes do programa e conta como o ecossistema de inovação pode se beneficiar da diversidade de gênero nas startups: levantamento da consultoria McKinsey revelou que empresas com diversidade de gênero em equipes executivas têm 25% mais chances de lucrar acima da média de mercado. 

1 – Programa Female Scale 

“Em 2021 o Distrito fez um estudo no ecossistema brasileiro de inovação sobre o gênero dos fundadores de startups, o Female Founders Report. Sabíamos que existia uma desigualdade de gênero, mas o resultado nos deixou muito espantados. Na comunidade de 800 startups residentes do Distrito o percentual de empresas fundadas por mulheres é de 20% a 25%. Porém, quando olhamos o ecossistema brasileiro, o percentual cai para 4,7% das startups. Ou seja, mais de 90% são fundadas exclusivamente por homens. Isso nos deixou bastante descontentes e decidimos fazer algo para impulsionar a participação feminina no empreendedorismo de inovação.”  

“Foi aí que nasceu o Female Scale – em cocriação com a B2Mommy, a Ambev e a Marisa – que é um programa de aceleração que pretende conectar negócios de mulheres empreendedoras ao ecossistema de inovação e tecnologia. Foram quase 400 startups inscritas. Na primeira fase, selecionamos 50 negócios que passaram por um bootcamp intenso de um mês. Após este período escolhemos as dez melhores para a etapa de tração, um programa intenso de doze semanas, em que oferecemos mentorias e treinamento em vendas, marketing, operação e captação. No mês de agosto foram divulgadas as três startups vencedoras do programa.” 

2 – Critérios de seleção e as vencedoras 

“Tínhamos cinco critérios de seleção no processo: tamanho de mercado, se a solução resolvia um problema importante da sociedade, equipe, modelo de negócio e valor do produto ou serviço. Das 50 selecionadas na fase inicial, as 40 que não seguiram para a fase de tração foram encaminhadas para o Distrito For Startups, para que elas pudessem dar continuidade ao negócio.” 

“As vencedoras foram as fintechs AkinTec e Idez e a legaltech Verifact. Todas conseguiram tracionar os seus negócios nas doze semanas do programa.” 

3 – Por que um programa para mulheres? 

“O que a gente percebeu com o estudo é que, além das mulheres serem menos encorajadas a fundar startups, elas têm uma jornada muito mais difícil durante o período inicial até conseguirem tracionar seus negócios. Falta rede de apoio, elas têm que conciliar a vida de empreendedora com muitas outras funções, como cuidar da casa e da família, além da dificuldade de acesso a investimentos. Com o programa, mostramos que ao dar essa rede de apoio na fase inicial, os negócios podem realmente crescer e dar certo.” 

“Um dado muito interessante de nosso estudo é que apenas 0,04% de todos os investimentos em startups no Brasil vão para empresas fundadas por mulheres. Do lado dos investidores, eles estão perdendo oportunidades de ótimos negócios. Um levantamento da consultoria McKinsey mostrou que empresas com maior diversidade de gênero em equipes executivas têm 25% mais chances de lucrar acima da média de mercado. E esse número sobe para 36% quando é contemplada também a diversidade étnica.” 

“No processo de captação de investimentos, nosso estudo revelou que mais de 70% das empreendedoras relataram ter sofrido algum tipo de assédio durante o processo. Por isso, na etapa final do programa, facilitamos essa conexão com investidores.” 

4 – Experiência como fundadora  

“Eu tive uma startup por dois anos e meio, com dois sócios homens. Mesmo assim, enfrentei diversas dificuldades e isso acabou contribuindo para que meu trabalho no Distrito pudesse ter esse olhar de inclusão. Quando ia captar investimento para a empresa era comum ser a única mulher em meio a mais de 50 investidores, todos homens brancos. Me perguntavam se eu tinha filhos, se tinha sócios homens e outras questões que jamais são feitas a fundadores homens. Quando eu fazia pitch sem meus sócios eu sentia claramente uma receptividade menor. Isso vai fazendo com que você perca a confiança e, muitas vezes, como você está inserida naquele contexto, nem percebe que aquilo que está acontecendo é de fato um preconceito por você ser mulher. Isso sem falar nas cantadas e outros tipos de assédio pelos quais passamos.” 

“Acredito muito na sororidade. Eu mesma fui ser investidora de startups com fundadoras mulheres após essa experiência. As mulheres que já conquistaram determinados espaços precisam ser facilitadoras para que outras possam chegar lá. Quando entrei no Distrito para ajudar outros empreendedores e corporações em seu processo de inovação, eu já tinha uma empatia e um entendimento de que tinha de fazer esse ambiente ser mais diverso. A minha experiência de vida me fez ter certeza de que, no Distrito, uma das minhas missões seria a de impulsionar negócios de outras mulheres.” 

5 – É preciso atuar em toda a cadeia 

“Devemos começar com a conscientização e a divulgação do problema. Trata-se de algo complexo, é preciso atuar em toda a cadeia. A Dani Junco, CEO da B2Mamy, diz que é necessário ter pessoas atuando na base da pirâmide com o objetivo de incentivar e fomentar mais mulheres a empreender com inovação. Para as startups iniciantes, falta essa rede de apoio que irá ajudar as empreendedoras a tracionar seus negócios. No topo da pirâmide estamos falando de aumentar a participação feminina nos fundos de venture capital. Hoje, as mulheres representam somente 3% dos investidores no Brasil. Isso reforça os vieses inconscientes que existem na captação de recursos. As perguntas detratoras acontecem por falta de empatia e de representatividade.” 

6 – (Maus) exemplos da falta de diversidade  

“Alguns casos clássicos já estão sendo divulgados, como o de uma startup fundada por dois homens que recebeu aporte de investidores homens para um produto feminino que não tinha demanda de mercado – a Pinky Glove, uma luva cor de rosa para a troca de absorvente íntimo. No viés de recorte racial, temos o caso de uma blogueira preta que ganhou de presente um kit com várias bases de uma marca famosa e nenhuma das cores servia para sua pele. Ao olhar o time que desenvolveu essa linha de cosméticos, ele era composto por homens brancos. Havia somente uma mulher na equipe. É disso que estamos falando, precisamos de novos pontos de vista nos negócios para não cometer erros tão básicos como estes.” 

7 – Outras causas-raízes 

“De uma maneira geral, as mulheres não escolhem cursos de universidades tradicionalmente ligadas à inovação, como engenharia ou tecnologia. É claro que não é necessário ter essa formação para ter uma startup. Mas o inverso é verdadeiro. A maioria das pessoas que se formam nesses cursos querem empreender com tecnologia.”  

“Além disso, quando as mulheres empreendem, mesmo em negócios tradicionais, elas escolhem normalmente negócios de menor risco e de menor valor agregado, portanto de menor lucro. Dados do Sebrae mostram que existem 40% de negócios de mulheres empreendedoras, um índice muito maior do que o do ecossistema de inovação. Porém, geralmente estas empresas são do segmento de beleza e vestuário, entre outros.” 

8 – O que vem por aí 

“Estamos iniciando o planejamento para o próximo ano e é bem provável que tenhamos uma nova edição do Female Scale. Aqui no Distrito, já temos um time 50% feminino e queremos ampliar a questão da diversidade por outros vieses/; racial, de idade, LGBT, pessoas com deficiência. Vamos anunciar em breve outro programa nessa linha. A diversidade é um valor muito forte no Distrito e vamos investir cada vez mais nisso para ampliar a consciência do ecossistema de inovação.”

Texto: Monica Miglio Pedrosa

Foto: divulgação 

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