Pioneira em cloud computing no Brasil, a Dedalus, que detém cerca de 20% do mercado brasileiro de serviços de cloud, é uma empresa que multiplicou seu faturamento em 30 vezes nos últimos 10 anos. A empresa gerencia hoje 60 mil servidores virtuais ou equivalentes em nuvem e teve um crescimento de 40% no faturamento em 2020.
Em entrevista ao Experience Club, o CEO da empresa, Maurício Fernandes, contou que a pandemia impulsionou grandes empresas a finalmente se renderem à cloud sem restrições e revelou quais segmentos se tornaram promissores, principalmente em função do impacto multiplicador na economia brasileira. Ele alerta ainda quais são os riscos da migração emergencial para cloud e como o tema Dados deve ser tratado de forma absolutamente estratégica, com gestão contínua dos dados, para que possa gerar informações relevantes para o negócio.
Como a pandemia e a necessidade emergencial de soluções digitais por parte das empresas gerou novas demandas por cloud?
Há um exercício importante a ser feito no que concerne à pandemia, que é pensar em como seria se ela tivesse acontecido há 20 ou 30 anos, com uma internet muito diferente da de hoje, sem TV a cabo, sem smartphone ou mídias sociais, então de certa forma temos que estar agradecidos por isso ter acontecido agora, senão o impacto seria brutalmente maior. Pensando do ponto de vista corporativo, houve uma primeira fase, em que surgiu o medo da queda de faturamento e vimos, inicialmente, um forte imediatismo para resolver as questões emergenciais, como o acesso remoto e permitir o mínimo de acessibilidade aos colaboradores que têm condições para isso. Outro movimento importante foi a adoção de cloud por grandes empresas. Muitas delas nos procuraram pedindo para migrar para a nuvem “para amanhã”. Tínhamos alguns projetos especiais importantes, principalmente de empresas internacionais, que estavam sendo discutidos durante anos. Hoje isso não se discute mais, é o óbvio que deve ser feito em uma situação de pandemia. Mas esta aceleração nem sempre é perfeita, por ter sido feita na correria. Em 2021 esperamos fazer a revisão de alguns projetos para que os clientes tenham um melhor custo-benefício no processo. Mas o mais importante é que pudemos ajudar nossos clientes financeiramente e também atuar de forma empática nas necessidades da comunidade.
Que ações a Dedalus fez neste sentido?
Felizmente nós estávamos em uma situação muito robusta financeiramente quando começou a pandemia. Tínhamos acabado de contratar um time muito bom para reforçar nossa equipe gerencial e algumas consultorias para nos ajudar a planejar 2021 antes mesmo do Coronavírus e esse time foi fundamental para ajudar a nos reposicionar rapidamente. Então, fiquei muito feliz de poder financiar muitos clientes, que vão nos pagar a longo prazo, em alguns casos até 2023. Entendemos que não fazia sentido estes clientes fecharem e, como tínhamos condição de ajudar, ajudamos. Foi o momento de pensar na parceria de longo prazo. Depois, clientes da área de saúde e da comunidade também nos pediram ajuda e engajamos clientes e colaboradores em ações comunitárias relevantes, como a informatização de leitos do HC de São Paulo. Estimamos ter impactado a vida de 200 mil pessoas com todas estas ações. Nosso lema em 2020 foi “Empatia gera resultados” e a gente o aplicou a cada segundo. Sem dúvida foi um ano que valeu a pena ser vivido, estávamos na posição de líder em vários aspectos e pudemos ajudar o mundo com o que sabemos fazer: usando a tecnologia e os recursos financeiros para fazer uma obra social mais pujante. Nosso lema em 2020: ‘Empatia gera resultados.
E como isso se refletiu nos resultados financeiros da empresa para este ano?
Nossa taxa de crescimento na última década foi em média de 40% ao ano. Isso significa que multiplicamos nosso faturamento em 30 vezes. Saímos de uma empresa de 9 milhões de reais de faturamento no primeiro ano para 300 milhões de reais em 2019. Como 100% de nossa receita é recorrente, isso acelera nosso crescimento. Iniciamos 2021 com uma receita já contratada maior do que tudo que faturamos em 2020, devido a esse efeito acumulativo. Crescer em um modelo desses é mandatório, se isso não acontecer é porque você está tendo um churn muito alto de clientes. Começamos o ano no período pré-Covid planejando um crescimento de 40% e chegamos a isso, mas é só uma coincidência numérica, porque este ano foi absolutamente atípico. Tivemos um churn de empresas que faliram ou que desistiram de fazer a transformação digital, principalmente empresas menores. Um cliente nosso do segmento de viagens viu o faturamento dele cair para 6% do que era antes, no início da pandemia. Mas para empresas maiores houve uma aceleração muito grande. O nosso ticket médio cresceu 70% no período 2019-2020, o que mostra essa mudança de perfil no mercado.
Que tipos de serviços foram impulsionados neste momento de crise?
Em 2020, 70% das nossas vendas foram na base instalada, porque na crise os clientes contam e confiam em nós para sua expansão digital. Também tivemos um incremento no número de clientes preocupados com otimização na nuvem, que é um assunto muito importante. Esse é um tema que sempre tratamos com os CIOs, dizendo que eles não podem deixar seu ambiente na nuvem se autogerenciar, é preciso monitorar muito de perto vários aspectos, pois pode haver um consumo muito maior do que o necessário.
[Segundo Maurício, estima-se que o mundo gasta 70% a mais de nuvem do que deveria, representando 100 bilhões de dólares de consumo mundial de nuvem absolutamente desnecessário. ]
Além da mudança de perfil de clientes, com a entrada de grandes empresas, houve demanda também de segmentos que normalmente não procuravam por soluções de cloud pré-Covid? Empresas da área de saúde, por exemplo, que costumam ser late adopters de tecnologia, fizeram este movimento?
Esta é uma crise parecida com a de 2008 e é muito importante comparar as crises para ter referência de procedimento. Depois da crise de 2008 alguns segmentos se desenvolveram bem e outros nem tanto e tiveram que se transformar. É o que está acontecendo aqui. Você vê alguns saltos acontecerem que não necessariamente irão durar a longo prazo. Um dos cenários prováveis é que as tecnologias de ponta, de medicamentos, tratamentos, venham já definidos de fora e que hospitais e centros de saúde importem ambientes completos. Os hospitais, por exemplo, que são dominados por três ou quatro empresas, não são favoráveis à adoção de soluções em nuvem porque os dados ficam dentro dos seus servidores, isso representaria uma perda de valor agregado para eles. Na saúde, o Brasil ainda tem um problema de enfermaria, não de análise clínica com inteligência artificial. Faltam leitos, equipamentos, a chegada de medicamentos na ponta e vamos sentir isso nos próximos meses com a questão da vacinação para a Covid. Quando vamos no laboratório da Microsoft e vemos os produtos que existem hoje para hospitais americanos, percebemos que existe um gap de décadas e isso é assustador. Resumindo, é um setor que queremos estar próximos e que vamos acompanhar.
E em relação a outros segmentos? Quais são os mais promissores?
Os serviços financeiros sem dúvida cresceram demais em 2020 e vão continuar em 2021. Desde fintechs, startups e bancos. Esse ano tivemos um case importante com o Banco Fibra, que migrou de um banco tradicional para um banco digital e estivemos com eles nesse processo. Na nossa visão de transformação digital nós entramos com a tecnologia e eles entram com a modernização do core business, já que entendem de seu negócio. Temos como clientes algumas fintechs enormes que já ameaçam o status quo do sistema financeiro no Brasil, mas também bancos de porte médio e empresas de seguro. No segmento financeiro temos que estar sempre à frente, pois eles têm demandas muito sofisticadas. Outro segmento que nos reaproximamos há alguns meses é o educacional. Existe um ecossistema enorme de empresas com soluções de EAD e de apoio a um ensino mais digital. Estamos descobrindo um mundo novo de startups e de empresas de serviço nesta área, devido à pandemia. E um terceiro segmento é o de empresas de TI, especialmente de software. Empresas de SaaS, como a Omie, que tem uma solução de ERP para pequenas empresas, ou a Neogrid, de soluções para gestão automática de supply chain, migraram para a nuvem este ano. A Omie tem 50 mil clientes na ponta, que são escritórios de contabilidade que se tornaram mais produtivos com o software deles. Ajudá-los com BI, informatização e IA representa um impacto multiplicador gigantesco. Isso muda o Brasil.
[Maurício Fernandes explica por que a empresa decidiu iniciar a expansão na América Latina pela Argentina.]
A Dedalus tem intensificado sua atuação na área de serviços de dados. Na sua percepção, quais são os principais desafios das empresas que estão percorrendo a jornada rumo a um modelo de negócios data driven?
Gostaria de usar uma analogia para responder a isso. Há 11 anos, quando começamos a mexer com cloud, falar sobre isso era uma heresia. Eu fui expulso de uma reunião com um grande banco – que à propósito hoje usa cloud – porque insistia em falar em cloud e eles diziam que isso não tinha a ver com o negócio deles. Então nós vivenciamos essa evolução no Brasil e isso foi muito importante, pois observamos várias falhas de entendimento humano sobre o que estava acontecendo e estas são as mesmas falhas que acontecem com o tema Dados hoje. Primeiro, dizia-se que cloud era muito fácil e que com três cliques você colocava seu ambiente no ar. O mesmo se fala agora de Dados: crie seu datalake, vamos passar seus dados para lá e, de uma maneira mágica, você vai começar a pensar sobre coisas que acontecem na sua empresa que você nem imaginava. Não é tão simples assim. Outra crença sobre cloud era a de que é um serviço muito barato, que a economia de dinheiro seria enorme e o resultado sensacional. O mesmo se fala de Dados hoje. A nossa bandeira é que Dados não é assim tão simples. Não é só criar o datalake, este é só o meio, você tem que fazer as alterações adequadas para ter um ambiente de dados moderno de onde irá extrair informações proveitosas. Senão será só gasto de tempo e de dinheiro.
E como deve ser este processo?
Hoje estamos envolvidos em vários projetos de migração de dados para nuvem, onde já estamos mudando a tecnologia do banco de dados, fazendo a limpeza dessa base e integrando esses dados com outros sistemas, que vão trazer inteligência para o negócio. Para extrair informação de dados é preciso ter algoritmos muito profundos e bem elaborados, isso precisa ser feito a quatro mãos com o cliente, que entende seu core. Devido à pandemia, as empresas querem fazer isso para ontem, mas nós alertamos que isso não vai funcionar. Planejamento não saiu de moda, o que entrou em moda é que planejamento e execução podem ser feitos ao mesmo tempo. Temos uma visão muito particular que desenvolvemos com a Gartner há dois anos sobre Dados. Há uma oportunidade enorme, mas as empresas devem entender que precisarão investir em uma gestão de dados contínua, pois a empresa, o mercado e os clientes mudam a todo o momento. Sem isso, vai acontecer o mesmo com os sistemas de BI há 15 anos. Muitas empresas investiram milhões de reais nestes sistemas e não conseguiram extrair nada. O projeto de Dados no Brasil não pode ser uma reprise do que aconteceu com BI, seria péssimo para o país. Planejamento não saiu de moda. O que entrou na moda é que planejamento e execução podem ser feitos ao mesmo tempo.
Em 2020, a Dedalus foi reconhecida pela ISG como líder em Cloud Computing pelo 3º ano Consecutivo, além de renovar a posição de Managed Service Provider (MSP) da Microsoft e da AWS. Na sua visão, quais são as características únicas da empresa que a levaram a estas conquistas?
O que nos torna únicos é que não nascemos agora. Existe um termo de que não gosto muito que é “born in the cloud”. São empresas que não sabem o que aconteceu antes do cloud e não têm experiências deste mundo anterior. Cloud é nossa quarta onda tecnológica, temos um conhecimento de várias ondas anteriores a esta. Tivemos um datacenter convencional. Isso legitima a reputação que temos. Então quando pegamos projetos complexos, híbridos, muitos provedores de serviço não têm essa vivência de legado que nós temos. Fomos também precursores, começamos a mexer em nuvem quando a AWS nem estava no Brasil. Acompanhamos a Microsoft no momento inicial que Satya resolveu reposicionar a empresa como cloud first. Fomos muito pioneiros e por isso nossa relação com estes provedores foi muito intensa, nos permitiu ter muita profundidade técnica em um momento que o mercado não estava tão aquecido quanto está hoje. Além disso reinvestimos toda a riqueza gerada para desenvolver este negócio. Hoje os principais especialistas em cloud são nossos colaboradores, alguns são os melhores do Brasil no que fazem.
Texto: Monica Miglio Pedros