Transparência, autonomia dos trabalhadores e geração de impactos sociais são os três principais pilares da iniciativa surgida no auge da pandemia da Covid-19
Fã da Gig Economy, em especial pela sua possibilidade de ampliar a autonomia dos trabalhadores, o empreendedor Rogério Nogueira vê o modelo de negócios de delivery praticado no Brasil com muitas ressalvas.
“São dois os principais problemas: a concentração do negócio em poucas empresas, o que é também um fenômeno mundial, e a falta de transparência no valor pago aos entregadores”, afirma.
“Os profissionais precisam saber quanto e por que ganham determinado valor. Ter previsibilidade. As regras, hoje, não são transparentes. A formação de preço dos serviços é obscura”, diz.
E foi exatamente com o objetivo de eliminar essas distorções do sistema que, junto com Pedro Saulo – seu ex-sócio na startup Allya -, que Nogueira criou, no ano passado, o AppJusto.
Nascido no auge da pandemia, o aplicativo já vinha sendo pensado, mas ganhou impulso e inspiração final quando o executivo assistiu ao episódio “Delivery”, do Greg News, série da HBO comandada por Gregório Duvivier, conforme conta, nesta entrevista ao Experience Club.
Um dos grandes diferenciais do app é que seu código-fonte é aberto, o que já reduz uma das principais barreiras de entrada a potenciais concorrentes.
Outra sacada é o estímulo à criação de frotas, que nada mais são do que grupos de corridas que podem ser organizados pelos próprios entregadores com condições e preços considerados justos por eles.
O modelo padrão da frota do AppJusto é uma corrida de R$10, até 5 km, e mais R$2 por km adicional. No momento, uma versão Beta do app já roda em alguns bairros da Zona Oeste e da Zona Sul, como Brooklin e Jabaquara e em áreas nas quais há rodízio.
Pelo modelo de negócio, que recebeu aporte de R$ 850 mil de investidores-anjo para sair do papel, a receita para manter a operação virá exclusivamente dos restaurantes. Nada sairá do bolso dos entregadores. Será cobrada uma taxa de cerca de 8% do total, montante bem abaixo dos cerca de 30% que, em média, o mercado abocanha.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
1 – Busca pela autonomia efetiva dos entregadores
“As plataformas, hoje, poderiam ser muito mais benéficas como geradoras de empregos. Mas elas estão sendo somente transacionais, conectando as pontas e ficando com uma porcentagem, ou estão impondo controle e suas regras, decidindo quanto sobra para os entregadores?”
2 – Fugir do jogo dos unicórnios
“Esse é um jogo de o vencedor leva tudo, de crescimento a qualquer custo, várias rodadas de investimento e dando resultado apenas para o mercado financeiro, não para os trabalhadores.”
“Nossos primeiros investidores têm a visão de impacto social. Gerar impacto antes do lucro.”
“Resultado não é o fim. Impacto é o fim.”
“Todo mundo tem que ganhar um pouco: o mercado financeiro, que ajudou o negócio a existir, e os trabalhadores. Gosto do princípio cooperativista.”
3 – Transparência na formação dos preços dos serviços
“É preciso olhar benefícios e direitos dos profissionais autônomos de uma maneira moderna. Mas não temos respostas para tudo. Estamos num momento de diálogo.”
“Transparência é um princípio básico. Os profissionais precisam saber quanto e por que ganham determinado valor. As regras, hoje, não são transparentes. A formação de preço dos serviços é obscura.”
4 – Organização por meio de frotas
“A qualquer momento, qualquer entregador tem a autonomia de criar uma frota com os parâmetros que quiser ou mudar de frota.”
“Não queremos gerar exploração nem leilão de preços.”
5 – Incentivo à visão coletiva
“Nosso código-fonte é livre. Esse foi um compromisso nosso. Isso diminui uma barreira de entrada, que é a criação de concorrentes.”
“Nosso compromisso é com desigualdade social, acabar com monopólio e as taxas abusivas e exploração do trabalhador. Esse mercado precisa de concorrência.”
“Esse não é um problema brasileiro. Meia dúzia de grandes plataformas dominam o delivery mundial.”
Texto: Luciano Feltrin
Foto: divulgação