Eduardo Mônaco, que assumiu como CEO nesse mês, fala sobre as novas frentes de negócio e sobre o crescimento das soluções antifraude para empresas de diversos segmentos
Por Monica Miglio Pedrosa
A ClearSale, fundada em 2000 por Pedro Chiamulera, é conhecida no mercado por suas soluções antifraude e de score de crédito. A empresa cresceu com os players de e-commerce brasileiros e consolidou nesses mais de 20 anos uma base de dados que acompanha o comportamento de compra do consumidor digital brasileiro. Em 2022, a companhia iniciou um processo de sucessão para a profissionalização da gestão, que se consolidou em maio desse ano com Eduardo Mônaco assumindo o cargo de CEO.
Estatístico de formação, Eduardo vem de uma trajetória no varejo, em empresas como C&A, Grupo Pão de Açúcar e Dafiti, além da Insurtech Minuto Seguros. Em entrevista à [EXP], ele fala sobre seu plano para consolidar a reestruturação da companhia em três unidades de negócio, diversificando as linhas de receita, num momento desafiador para o varejo brasileiro, com taxas de juros em alta e vendas em baixa.
A primeira delas é a unidade de soluções antifraude e score de crédito para e-commerce. Segundo o Mapa da Fraude 2022, levantamento realizado pela empresa, mais de 5,6 milhões de tentativas de fraude foram feitas no ano passado, com um valor total de R$ 5,8 bilhões.
As duas outras unidades de negócio são a de Application Fraud, voltada para empresas de vários segmentos, e a New Ventures. De acordo com dados da ClearSale, hoje, mais de 100 mil empresas usam sua tecnologia, considerando a base de parcerias e alianças nos países em que está presente – além do Brasil, a ClearSale tem escritórios na Austrália, EUA e México.
Eduardo, você assumiu agora em maio oficialmente a posição de CEO da ClearSale, mas o processo sucessório iniciou no ano passado. Como foi essa transição?
Eduardo Mônaco – Entrei na ClearSale há 4 anos na função de COO, quando a empresa estava passando por um processo de profissionalização da gestão, saindo da mão dos fundadores do negócio. Há 8 meses anunciamos esse processo sucessório, quando eu assumi como diretor presidente e tinha o CFO como par na gestão, cuidando da operação no dia a dia, enquanto o Bernardo [Lustoza, CEO anterior], que foi um dos primeiros funcionários da empresa, passou a olhar de forma mais estratégica o futuro da companhia. Hoje ele se junta ao Pedro [Chimulera, fundador] no Conselho.
No último ano, como diretor presidente, você também esteve à frente da reestruturação do negócio após o prejuízo reportado pela empresa em 2021. Quais foram as principais decisões tomadas para reverter a situação?
Fizemos um IPO extremamente bem-sucedido em julho de 2021, em plena pandemia. Captamos recursos, o que nos permitiu alavancar nossa capacidade de investimento e surfar a onda de crescimento propiciado pela digitalização do período. Até que o mercado virou. Usamos o termo tempestade perfeita para explicar esse período. Por sermos uma empresa de receita recorrente, quando nossos clientes não crescem, isso tem um impacto na receita e no nosso PNL. Saímos de uma taxa de juros de 2% para 12% (em 2022), o que impactou o ecossistema como um todo. Estive à frente do que chamamos de “Plano de Equilíbrio”, buscando um balanço para o crescimento sustentável de longo prazo, de forma gradual. [No quarto trimestre de 2022 a empresa reportou lucro líquido de R$ 5,2 milhões, revertendo prejuízo líquido de R$ 44,3 milhões no mesmo intervalo de 2021, com Ebitda de R$ 5,9 milhões].
Quais são suas metas para os próximos anos na posição de CEO?
Até 2025 o foco é continuar consolidando nosso processo de reestruturação e reorganização da empresa em três unidades de negócio. A primeira é a frente de e-commerce, onde a ClearSale nasceu e se consolidou como grande especialista em fraudes no Brasil. O primeiro serviço que criamos atendeu à dor de um dos principais varejistas digitais do mercado [Submarino, em 2022], que precisava de alguém que cuidasse da parte de fraudes e do SLA (Service Level Agreement, o tempo de resposta de um determinado serviço) de aprovação da compra do cliente final. Aos poucos, passamos a oferecer nossos serviços para outros players do varejo. Nosso negócio foi crescendo com a digitalização do comércio no país. Hoje temos um conhecimento de único, com taxas de aprovação de 95% a 98% e taxas de fraude de 0,2% a 0,4% no e-commerce brasileiro.
Que tecnologias são empregadas na avaliação de crédito e na detecção de fraude que permitem essas taxas de sucesso?
É muito importante entender a qualidade da informação que a gente tem. Imagine que hoje passam por nós 110 milhões de transações em média por mês. Recebemos informações de players relevantes há 20 anos. Usamos esse efeito de rede, colaboração e neutralidade, aliado à tecnologia em algoritmos de inteligência artificial para construir a maior base de dados do consumidor digital brasileiro. Recebemos dados proprietários de frequência de compra, endereço de entrega das mercadorias, produtos consumidos etc. Também sabemos se você paga em dia, se atrasa a fatura, ou se tentou fazer uma fraude. Tudo isso, claro, 100% alinhado à LGPD.
Quais são as duas outras unidades de negócio?
A segunda unidade de negócios é a de Application Fraud – que o mercado conhece como Onboarding – e que hoje já representa 25% da nossa receita, onde oferecemos aplicações de segurança para outras indústrias como bancos, telecomunicações e fintechs. Validação cadastral e de dados, monitoramento de perfil, verificação de antecedentes criminais, biometria fácil e outras tecnologias estão nessa unidade. E a terceira é a que chamamos de New Ventures, onde temos três grandes apostas no momento: entrar de forma mais intensa no segmento de crédito, em cibersegurança e em novos arranjos de pagamento, como por exemplo o Pix.
O que vocês desenvolveram de tecnologia antifraude para o Pix?
Essa é uma grande aposta nossa, que tem alto market fit e crescimento exponencial, por ser um arranjo de pagamento razoavelmente novo. Vou citar três exemplos de fraude no Pix em que podemos atuar. O primeiro é em casos de sequestro: é comum você ter de passar Pix para diversas contas diferentes quando isso acontece. Nossa tecnologia detecta esse padrão, que foge do comportamento do usuário, principalmente se você faz Pix sequenciais para diversas contas, e nossa análise pode parar o processo, bloqueando o crédito no destino. Um segundo exemplo é o caso de aberturas de contas por laranjas para processos de transição de dinheiro no Pix. Outro exemplo é o que chamamos de engenharia social, em que pessoas criam códigos PIX ou QR Codes que não são legítimos para receber dinheiro via Pix de forma ilícita. Com o padrão de tecnologia da ClearSale, a gente consegue identificar e resolver esses problemas.
Recentemente o Banco Central também incluiu vocês no piloto do Real Digital, junto a grandes bancos. Qual vai ser o papel da ClearSale nesse piloto?
Essa é outra frente da unidade de negócios New Ventures, que direciona nossas tecnologias para a validação de novos arranjos de pagamento. Também fomos chamados no piloto do LIFT (Laboratório de Inovações Financeiras e Tecnológicas) do Banco Central, que testou a identidade digital distribuída. Nosso papel será o de colaborar na verificação de identidade, na validade de transações e em como melhorar a experiência do usuário final.
Em relação ao segmento de análise de crédito, qual será o diferencial da ClearSale em relação a outros players do setor?
Nosso dado é transacional, então a gente tem um nível de inclusão e de consistência únicos nos dados. Informações comportamentais de consumo são muito valiosas, com isso conseguimos dar uma dimensão adicional ao processo de análise de crédito. Vale destacar que nosso propósito é tornar a vida digital das pessoas mais simples, segura e justa. Imagine que um bureau de crédito ou uma instituição financeira possa não dar crédito para uma pessoa que já foi negativada em algum momento da vida dela. Mas eu vejo que o hábito de compras digital dela hoje é regular, contínuo, e o pagamento está em dia. Essa informação adicional pode ser o diferencial para permitir o acesso a crédito para essa população que hoje não atende a critérios mais tradicionais de análise.
Quando você fala que uma das frentes da ClearSale é investir em serviços de cibersegurança, esse é um campo muito abrangente. Quais serão os focos principais da empresa?
Começamos essa tese por três hipóteses principais. A primeira é a de antiphishing, quando fraudadores criam um site falso em nome de um determinado varejista, ou um falso perfil de rede social e causa danos não só para a marca como para o consumidor, que nunca receberá o produto pelo qual acredita que comprou. Nossa tecnologia identifica estes sites de forma automática e os remove. Outra tese é a de monitoramento de marca, quando fraudadores vendem produtos falsificados de uma marca visada em vários marketplaces. Conseguimos identificar essa prática e tirar o produto de venda. Por fim, o vazamento de dados, algo que tem assombrado as empresas. Rastreamos na Deep Web, na Dark Web para ver se existem dados vazados de um determinado negócio para proteger proativamente a empresa de ataques que possam vir a acontecer.