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Cargo X acelera com virada digital dos caminhoneiros

A migração em peso de caminhoneiros e embarcadores para aplicativos de comunicação como o Whatsapp e outras ferramentas digitais, durante a pandemia, associada a um aporte recente de R$ 445 milhões, está permitindo à Cargo X impor novo ritmo aos negócios.

“Em um ano, crescemos o equivalente a cinco”, diz Federico Vega, fundador da empresa. “Todo dia recebemos mil novos caminhoneiros na plataforma”.

Fundada em 2013, a Cargo X é conhecida também como a Uber dos caminhoneiros. Através de um aplicativo, conecta quem tem carga para transportar a transportadores.

Com uma parte do dinheiro do aporte, recebido em abril de 2020 da LGT Lightstone e Pattac, a empresa investiu na criação de novas funcionalidades e ferramentas para aumentar a segurança na contratação de fretes pela plataforma. Com a outra, deu impulso a serviços financeiros, como o programa Capital de Giro, que em 2020 liberou R$ 400 milhões para transportadoras parceiras.

O resultado foi um crescimento de 48,3% no número de usuários do aplicativo e de 75% no faturamento da empresa, diz Vega. Segundo o empresário, para este ano, é esperada expansão de 40% na receita.

Com a aceleração dos negócios, a logtech (startup do ramo de logística), que tem em seu conselho administrativo nomes como Oscar Salazar (ex-CTO do Uber) e Hans Hickler (ex-CEO DHL), entrou para a lista das 17 empresas com potencial para de tornarem unicórnios este ano, segundo um relatório do ecossistema de startups Distrito.

Em entrevista ao Experience Club, Vega relembra os difíceis primeiros anos da startup, fala sobre os desafios do setor e projeta um mercado dominado por caminhões self-drive em 20 anos. 

1 – Como tudo começou 

“Nasci em Puerto Madryn, na Patagônia Argentina, onde vivi até os 17 anos, quando fui estudar Economia em Buenos Aires. Fiz um mestrado em Finanças na Universidade de Southampton, no Reino Unido. Em Londres, trabalhei por seis anos na JP Morgan. Foi quando decidi voltar à América Latina para trabalhar com algo que me apaixonasse”.

“Desde os oito anos, era um aficionado por viagens de bicicleta. Nestas viagens fui conhecendo as estradas e os caminhoneiros eram nossos companheiros”.

“Ao conviver com eles fui descobrindo suas dores: 60% do tempo eles rodam com os caminhões vazios, sem carga. Sem dinheiro, seus veículos são antigos e quebram nas estradas”.

“Vi ali uma oportunidade, a de construir um aplicativo, que era a tecnologia que estava surgindo em 2011, para conectar os caminhões com o mercado. Queria voltar para as estradas, agora de outra forma.” 

2 – Os difíceis anos iniciais 

“Comecei a economizar dinheiro, dividindo o apartamento com um colega. Ele brincava que eu ganhava dinheiro durante o dia – no JP Morgan – e gastava à noite, desenvolvendo o aplicativo que daria início à Cargo X”. 

“Nesse início, usei meu próprio dinheiro até que chegou a um ponto em que precisei buscar investimento e me dedicar full time ao negócio. Foi quando saí do meu emprego”. 

“Conheci um programa de startups no Chile, que pagava US$ 40 mil para quem criasse um negócio no país. Então, voltei para a América Latina”.

“O advogado que me ajudou a abrir a empresa para receber o investimento se tornou um investidor anjo do negócio e meu ex-chefe do JP Morgan também”. 

“Nessa época, os caminhoneiros não tinham smartphone, se conectavam por rádio. O público do aplicativo era o filho deles, que estava conectado em casa e avisava o pai da oferta de cargas”. 

“Nessa época, eu divulgava a plataforma nos eventos de transporte que falavam de tecnologia, era onde eu encontrava os early adopters que começaram conosco”. 

“No início, também era difícil contratar bons profissionais. As startups não tinham o apelo que têm hoje para os jovens talentos”. 

“Nesses anos iniciais, achamos que íamos quebrar. Até que o WhatsApp liberou a ligação pelo aplicativo e os caminhoneiros começaram a migrar para os smartphones, para ficar em contato com a família.” 

3 – Conexão é o oceano azul da Cargo X 

“Em 2016, conheci o ex-CTO da Uber, Oscar Salazar, e ele ajudou a Cargo X com equipe de tecnologia e entrada de capital. Foram três rodadas de investimento. Captamos US$ 10 milhões. Começamos o ano com sete funcionários e terminamos com 100. Em 2017, vieram outros US$ 50 milhões”.

“Quando o mercado se conectou é que começamos a crescer de forma consistente. Não havia internet nas estradas antes. Chegamos a instalar totens conectados à internet em alguns postos para caminhoneiros, no início. Hoje, o posto de combustível ou parada de caminhões que não tiver wi-fi gratuito não tem clientes. Cada vez mais as operadoras investem em redes 4G nas estradas.” 

4 – Foco nos pequenos empresários 

“Nosso foco é conectar pequenos empresários e caminhoneiros no transporte de qualquer tipo de carga, com valores até R$ 500 mil”. 

“Esse grupo de caminhoneiros roda a maior parte do seu tempo com o caminhão vazio. Fica parado em postos aguardando uma oportunidade e gastando em alimentação e estadia. Viaja rápido entre cidades, pois está vazio e quer ganhar tempo. Esse comportamento acaba gerando acidentes”.

“Por não ter dinheiro nem acesso a crédito, seu caminhão é antigo. Precisamos ampliar as possibilidades para que ele fique 100% do tempo carregado. Isso aumenta sua renda e permite que ele tenha um empréstimo para financiar um novo veículo. É um ciclo virtuoso de crescimento.” 

5 – Produtos financeiros 

“Eu monitoro o comportamento do caminhoneiro na plataforma, não só no momento em que ele coleta e entrega a mercadoria dentro do tempo esperado, mas também no feedback dos clientes sobre sua entrega”.

“Em parceria com empresas, instalamos GPS nos caminhões, assim conseguimos monitorar outros aspectos de sua direção e da entrega da carga”.

“Com os dados de comportamento dele e o volume de caminhoneiros na plataforma, podemos conseguir empréstimos financeiros a juros reduzidos, oferecer factoring para que ele possa receber o dinheiro de forma antecipada e financiar capital de giro aos embarcadores.” 

6 – Efeitos da pandemia: 

“Os meses de março e abril paralisaram tudo. O lado positivo é que a necessidade de digitalização, para permitir o acesso aos serviços durante o isolamento social, fez com que os caminhoneiros não só adquirissem seu primeiro smartphone e entrassem na internet, como também pularam etapas de aprendizado online. Logo que se conectaram já abriram suas contas bancárias pelo celular”.

“Foi um processo muito rápido. Porém, mais importante do que olhar as métricas de crescimento, é saber se estes novos usuários se manteriam na plataforma quando o mercado começasse a voltar à normalidade. E essa é a grande notícia de 2021. Depois de experimentar um produto que propicia uma experiência on-line exponencialmente melhor, é muito difícil a pessoa voltar para a experiência anterior, off-line. Nossos usuários têm se mantido na plataforma e o crescimento continua acelerado.” 

7 – Soluções para os desafios do mercado 

“Comemoramos os números de 2020, mas mais importante é adicionar valor aos nossos usuários. São três os principais desafios”.

“O primeiro é aumentar a oferta de trabalho e reduzir a ociosidade dos caminhões”.

“O segundo é reduzir a linha de custos deles: alimentação, combustível, seguro para o caminhão. Temos feito parcerias com redes de postos para obter desconto no combustível e na alimentação para os associados da plataforma”. 

“O terceiro desafio é oferecer produtos e serviços que ele não tinha acesso antes, como empréstimo pessoal e factoring.” 

8 – Visão de futuro 

“Em cinco anos, os caminhoneiros vão ganhar o dobro do que ganham hoje e, com isso, a frota será mais nova, com no máximo dez anos de uso”. 

“Em uma década, os caminhões semiautônomos começam a ser uma realidade. Em 20 anos, esse motorista de caminhão vai poder ter um veículo self-drive e ele vai gerenciar seu investimento à distância”.

“Esse futuro é um consenso do mercado, o que se coloca em discussão é o tempo necessário para cada uma dessas transformações.” 

Texto: Monica Miglio Pedrosa

Imagens: reprodução e Niguel Tadyanehondo (unsplash)

 

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