O mercado mundial de vendas ao consumidor final (B2C) é estimado hoje em US$ 2,6 trilhões. Em 2025, segundo a Accenture, os negócios gerados entre as próprias empresas (B2B) baterão a marca de US$ 10 trilhões. Isso significa que o indivíduo vai perder seu status no topo da cadeia do consumo? Muito pelo contrário: o que está mudando dramaticamente é o ecossistema dos negócios até chegar ao consumidor.
Se a companhia onde você trabalha continua praticando o modelo linear de produção, distribuição e venda ao cliente na ponta, sem ter mudado muita coisa nos últimos dez anos, há uma possibilidade razoável de que ela não esteja mais entre nós na próxima década. Pode parecer um prognóstico exagerado ou até dramático, mas algumas reflexões sobre as mudanças rápidas que estão acontecendo no cenário da concorrência dão pistas que a transformação do modelo convencional de se fazer negócios está só começando.
Exemplo: qual é a receita que a infraestrutura de TI promete trazer para a sua empresa este ano? Isso mesmo: a pergunta é sobre venda, não “custo”. Na Amazon, cujo negócio principal é o varejo e nasceu vendendo livros, a TI representa nada menos que 67% da receita total da companhia, avaliada em abril em US$ 775 bilhões e disputando palmo a palmo com a Apple a corrida para ver qual será a 1ª empresa “do trilhão” da história.
O que gigantes como a Amazon estão fazendo é transformar o seu modelo e infraestrutura em um ecossistema no qual milhares de empresas se juntam para desenvolver negócios entre si, provocando o crescimento exponencial de todo o negócio. São as chamadas “empresas-plataforma”, que estão mudando a forma como toda a cadeia da indústria e serviços vão se relacionar daqui para frente.
“Nós viemos de uma cultura da organização fechada, voltada para dentro, mas agora entramos no momento da colaboração”, enfatiza a empreendedora serial israelense Lital Maron, que foi destaque no Innovation Lab realizado pelo Experience Club na segunda-feira, dia 11.06, no Villagio JK, em São Paulo. O evento teve como tema “A nova era do business plataform model” e reuniu CEOs e executivos de tecnologia de grandes empresas e contou ainda com apresentação de Guga Stocco, fundador da Money Ex e um dos maiores especialistas em soluções de fintechs do Brasil.
A mensagem mais forte do conceito de plataforma é que não se constroem mais impérios solitários. Quanto mais aberto for o seu modelo, maior a conectividade e o valor percebido que o seu negócio desenvolve ao longo do tempo. “A Tesla abre o projeto dos seus carros na internet para quem quiser ver e copiar, porque ela sabe que o seu valor percebido não está no processo de fabricação”, compara Guga. Se há mais empresas desenvolvedoras trabalhando, o custo cai radicalmente sem que o seu produto necessariamente perca valor. “No Brasil damos importância demais na manufatura, que normalmente não é o asset principal da empresa”, acrescenta.
Para qualquer negócio
Embora as empresas de origem digital estejam nadando de braçada, o conceito de plataforma não necessariamente é um atributo para quem nasceu na “nova economia”, como se dizia no início do século. Fundadora da Unfold Media Group, com sede no Canadá, Lital cita o exemplo da G&E, que criou a Predix, uma plataforma aberta de soluções de IoT (internet das coisas, do inglês), para qualquer empresa que deseje conectar equipamentos diversos da cadeia industrial, permitindo também que desenvolvedores ajudem a expandir o serviço. “No mercado financeiro, temos visto experiências interessantes em grandes bancos como ING, que desenvolveu duas plataformas abertas B2C e B2B, e o BBVA, com um ecossistema de APIs para transações bancárias”, afirma.
É no mundo das fintechs, por sinal, que as transformações tecnológicas prometem mudar mais rapidamente a nossa relação com as instituições, ou o próprio dinheiro. Na China, como destacou Guga, a gigante WeChat está praticamente eliminando o uso do papel-moeda ou do cartão de plásticos com um sistema de créditos pré-pagos no celular que está sendo usado para pedir emolas. Agora o aplicativo de mensagens quer se tornar um dos maiores fundos de investimentos, com produtos desenhados para o cliente do smartphone, encerrando de frente o grande sistema financeiro.
A concorrência não está mais nas empresas de um determinado segmento e pode vir de um conjunto de provedores de serviço, sem um “rosto” definido, o que começa a ser possível a consolidação de novas tecnologias, a exemplo do protocolo blockchain. Como lembra Guga, o Uber não reinventou o automóvel, mas revolucionou o “design do serviço”. “Essa é uma matéria que deveríamos ter na faculdade, mas isso não existia até bem pouco tempo atrás. As empresas precisam ser fluidas para se adaptar a essas transformações cada vez mais rápidas e constantes”, defende.
Web value
O conjunto de mudanças tecnológicas que estamos vivendo agora abre uma nova etapa da evolução da internet, até aqui centrada na comunicação, seja através da troca de dados, voz e imagem. A web passa agora para a geração de valor, numa complexa teia que envolve monetização (virtualização do dinheiro), gerenciamento de dados, inteligência artificial, machine learning, entre outros. “É a desmaterialização da web: o hardware está se transformando em software”, destaca Guga.
Lital acrescenta que os modelos de negócios que nascem agora só se tornaram possíveis nos últimos dez anos, com o advento dos smartphones, criando uma nova relação entre oferta e demanda. Daí a importância dos ecossistemas que podem ser criados em torno das plataformas de negócios.
“Instantâneo, personalizado, relevante e humano: esses são os quatro elementos que todos estão buscando em uma solução de ideal”, diz a consultora israelense.